Com colaboração de Geraldo Silveira
Como se trata de um assunto recente no setor solar e com cada vez mais recorrência nas rodas de investimentos é importante estarmos por dentro de todas as nuances envolvidas nesse tipo de projeto.
Dessa forma, antes de nos aprofundarmos na comparação financeira entre o uso do BESS e dos geradores diesel, é de extrema importância nos atentar aos temas que estão correlacionados a esse tema pois servirão de base para entendermos as premissas para o retorno financeiro.
Assim sendo, na primeira parte deste artigo, para nivelar o conhecimento, serão abordados tópicos sobre a tarifação de consumidores do mercado cativo, uso de sistemas diesel, sistemas com armazenamento de energia e métricas de retorno financeiro.
Sistema de Tarifação de Clientes do Mercado Cativo
O sistema de tarifação de clientes do mercado brasileiro é dividido em dois tipos de consumidores, que são denominados como consumidores do ambiente de contratação livre e consumidores de contratação regulada.
O foco deste artigo são clientes do mercado cativo do Grupo A. Dessa forma, para que o artigo não se torne extremamente extenso, faremos apenas as considerações relacionadas a esse tipo de consumidor.
As modalidades tarifárias do mercado brasileiro para os clientes cativos são definidas pela Resolução Normativa ANEEL n° 1000/2021 e no Módulo 7 dos Procedimentos de Regulação Tarifária – Proret.
Consumidores do Grupo A: com exceção de clientes da rede de distribuição subterrânea, que são denominados como clientes do tipo AS, os clientes do grupo A são aqueles atendidos com tensão superior a 2.3 kV. Sendo estes subdivididos conforme seu nível de tensão:
- Subgrupo A1: tensão maior ou igual a 230 kV;
- Subgrupo A2: tensão maior ou igual a 88 kV e menor ou igual a 138 kV;
- Subgrupo A3: tensão igual a 69 kV;
- Subgrupo A3a: tensão maior ou igual a 30 kV e menor ou igual a 44 kV;
- Subgrupo A4: tensão maior ou igual a 2,3 kV e menor ou igual a 25 kV.
Para esses clientes, são cobrados valores referentes à demanda de potência e ao consumo de energia. Será convencionado nesse artigo que o termo “energia” no contexto de tarifação está incluso nos valores, a tarifação do uso do sistema de distribuição/transmissão (TUSD/TUST) e tarifação do uso de energia elétrica (TE).
O faturamento de energia nesses consumidores é definido conforme subgrupo tarifário e posto tarifário.
Com relação ao posto tarifário, esses clientes são tarifados pelo consumo em posto tarifário de ponta – período diário de 3 horas consecutivas, com exceção feita aos sábados, domingos e feriados nacionais – e posto tarifário fora de ponta – período diário composto pelas horas consecutivas e complementares ao horário de ponta.
Devido à alta demanda de energia no sistema de distribuição de energia no horário de ponta, o consumo de energia nesse posto tarifário é mais dispendioso, se comparado ao consumo de energia no posto tarifário fora de ponta. Entrando na seara dos tipos de subgrupos tarifários, são definidos dois subgrupos:
Tarifação Horária Azul: disponibilizado para os todos os subgrupos tarifários do grupo A, com tarifas diferenciadas de consumo de energia e demanda de potência conforme posto tarifário. Vale lembrar que esse cliente precisa solicitar dois valores de demanda.
Tarifação Horária Verde: disponibilizada apenas para os consumidores A3a, A4 e AS, com tarifas diferenciadas de consumo de energia conforme posto tarifário e uma única tarifa de demanda de potência.
Uso do gerador diesel para abatimento do consumo no horário de ponta
Muitas empresas optam por operar parte ou a totalidade de suas cargas por meio de geradores a diesel no horário de ponta.
A estrutura mais comum de um sistema de abatimento de energia com gerador diesel inclui o próprio grupo gerador dimensionado para atender a carga e o consumo necessário, uma chave de transferência manual ou automática para isolar a instalação da rede e direcionar o fornecimento para a geração do gerador diesel, além de sistemas de controle, proteção e eventualmente integração com sistemas de automação para acionamento programado.
O dimensionamento deve levar em consideração a potência ativa e reativa das cargas que permanecerão em operação, o fator de simultaneidade, o regime de uso (tipicamente algumas horas por dia) e o tempo de partida para evitar picos indesejados de demanda antes do acionamento do gerador.
Do ponto de vista econômico, os benefícios são claros. O custo de geração com diesel, mesmo considerando preços elevados do combustível, em algumas concessionárias de energia é inferior ao custo da energia elétrica no horário de ponta.
Por outro lado, é necessário observar aspectos operacionais e ambientais. O uso de geradores implica custos com combustível, manutenção preventiva, controle de horas de operação e, dependendo da potência e do tempo de uso, pode exigir licenciamento ambiental. Também é importante considerar impactos relacionados a ruído e vibração, principalmente em áreas urbanas.
Do ponto de vista regulatório, a instalação deve seguir as normas técnicas da distribuidora local, bem como outras determinações da ANEEL. Em sistemas com paralelismo à rede, é necessária aprovação formal da concessionária. Já no caso de sistemas com chave de transferência aberta, em que não há operação simultânea com a rede, o processo costuma ser mais simples.
Nos últimos anos, o uso de geradores para abatimento de ponta tem sido complementado por soluções mais modernas, como sistemas de armazenamento de energia por baterias, que permitem a redução da demanda sem emissões de gases poluentes.
Capex e Opex de geradores a diesel
O CAPEX e o OPEX de geradores a diesel variam conforme a potência instalada, o regime de operação e o nível de automação do sistema.
A maior parcela do CAPEX está no próprio grupo gerador, cujo custo por kVA diminui à medida que a potência aumenta. Já o OPEX engloba os custos operacionais (consumo e armazenamento do combustível) e de manutenção ao longo da vida útil do equipamento, que normalmente varia de 15 a 20 anos.
Ressalta-se que o consumo do diesel depende da potência da carga a ser alimentada pelo gerador diesel. Na Tabela 1 é apresentado um exemplo de curva de consumo de diesel em função da potência a ser alimentada pelo grupo gerador diesel.
Tabela 1 – consumo de combustível do gerador diesel em função do percentual de carga

Os custos com OPEX que envolvem manutenções corretivas e preventivas, costumam girar em torno de 1% a 2% do CAPEX do equipamento.
Benefícios do BESS para clientes do Grupo A4
O uso de de sistemas de armazenamento de energia em baterias (BESS) pode trazer ganhos financeiros e operacionais relevantes para consumidores do grupo A4. Entre as principais aplicações temos:
- Redução de custos com demanda contratada por meio do peak shaving, utilizando as baterias para suprir picos de potência e evitar cobranças elevadas;
- Diminuição do custo de consumo no horário de ponta, ao carregar as baterias em períodos de energia mais barata e descarregá-las nos horários de tarifa mais alta (time of use).
Capacidade total de armazenamento de BESS
O foco desse artigo não é comentar de forma detalhada as considerações sobre o dimensionamento técnico do BESS, como considerações sobre eficiência, corrente máxima de carga e descarga da bateria, modelagem da degradação em função da temperatura e ciclos de carga e descarga, limites de tensão mínima e máxima do inversor, ente outros itens.

onde,
DoD (deep of discharge): Profundidade de descarga máxima da bateria. Que para o lítio é de 90%;
RTE (round trip efficiency): Eficiência geral do BESS, que se pode adotar o valor de 90% (perdas pela alimentação do sistema de iluminação, controle e de refrigeração, conversão CC/CA, etc.), como bem conservador.
SoH (state of health): Condição de degradação da bateria em relação a sua condição inicial, em geral, pode-se adotar o valor de 20%-30%.
Indicadores para a análise econômico-financeira
Existem diversos indicadores que podem ser utilizados para demonstrar a viabilidade de projetos. Neste artigo, serão utilizados o payback descontado, o valor presente líquido (VPL) e a taxa interna de retorno (TIR).
Payback descontado
O termo “payback” representa o tempo que o projeto levará para que os rendimentos do projeto se igualem ao investimento inicial. O payback descontado (PD) traz os fluxos de caixa ao mesmo intervalo de tempo (a valor presente), incorporando o conceito do valor do dinheiro no tempo.
Valor presente líquido
A medida do valor presente líquido (VPL) é obtida pela diferença entre o valor presente dos rendimentos do projeto e o valor presente dos investimentos.

Onde,
i = o ano de análise do fluxo de caixa;
n = tempo total de avaliação do projeto.
A avaliação de um investimento pelo indicador de VPL é resumida pela tabela abaixo:
Tabela 2 – Critérios de decisão usando o VPL
Taxa interna de Retorno
A taxa interna de retorno (TIR) representa a taxa de desconto que iguala os rendimentos do projeto com os investimentos.
Onde,
i = o ano de análise do fluxo de caixa;
n = tempo total de avaliação do projeto.
Para este trabalho, será considerado o valor mínimo de 12% para a TIR.
Estudo de caso
O presente estudo visa comparar a viabilidade financeira para substituição de um sistema diesel por um sistema BESS para atendimento do horário de ponta na concessionária Equatorial PA.
O estudo foi feito com base nos dados de consumo de energia da unidade consumidora, em média horária, iniciando em 1º de janeiro de 2023 a 31 de dezembro de 2023, levando-se em conta os custos de energia e demanda em cada posto horário, considerando o tempo de análise de 15 anos.
Figura 1 – curva de consumo do estudo de caso. Fonte – Autor
Durante a descarga das baterias do sistema de armazenamento, apesar do paralelismo com a rede da concessionária, não poderá ter injeção de energia no sistema de distribuição.
Neste artigo, serão fornecidos detalhes sobre as considerações técnicas para o dimensionamento do sistema de armazenamento – taxa de carga/descarga máxima, dimensionamento dos inversores, efeito da temperatura, entre outros.
Todas as simulações foram realizadas no software Homer Grid da fabricante UL Solutions, sendo este amplamente utilizado para a otimização de sistemas elétricos com múltiplas fontes de energia (sistemas híbridos) e com armazenamento de energia.
A unidade consumidora, base do estudo, possui as seguintes características:
Tabela 2 – Características da Unidade Consumidora
Características das concessionárias de energia
As tarifas da Equatorial PA, base do estudo, possuem os seguintes valores:
Tabela 3 – Características da tarifa de energia

Principais características do sistema armazenamento
O BESS possui as seguintes características:
Tabela 4 – Características do Sistema de Armazenamento
Notas:
- Inclusos todos os custos com equipamento, engenharia e instalação.2.
- Ajuste anual em função do IPCA
Principais características do gerador diesel
As tarifas das concessionárias de energia, base do estudo, possuem as seguintes características:
Tabela 5 – Características do Gerador Diesel
Notas:
- Ajuste anual em função do IPCA
Análise da viabilidade financeira
Conforme já citado, a análise financeira se baseou na comparação do uso de um sistema diesel e de um BESS para o atendimento do horário de ponta na concessionária Equatorial PA. Na Tabela 6 constam os resultados financeiros do estudo de caso.
Tabela 6 – Resumo financeiro
Conclusão
Os resultados obtidos neste estudo mostram que a utilização de um sistema de armazenamento de energia em baterias (BESS) para o atendimento da demanda no horário de ponta apresenta vantagens econômicas em comparação ao uso de grupos geradores a diesel.
A análise financeira, considerando as condições tarifárias da Equatorial PA, demonstrou que o BESS obteve um VPL superior, uma TIR mais elevada e um tempo de payback descontado inferior ao do gerador a diesel.
Além dos benefícios financeiros, o uso de sistemas BESS traz vantagens operacionais e ambientais relevantes, como a redução de ruídos, eliminação de emissões locais e menor necessidade de manutenção quando comparado ao gerador diesel.
Dessa forma, conclui-se que, para o cenário analisado, a alternativa com BESS se mostra mais atrativa sob os pontos de vista econômico, além de ser menos poluente durante a operação.
Referência
[1] ASSAF NETO, A.; LIMA, F. G. Curso de administração financeira. 3ª Edição. São Paulo, Atlas, 2014.
As opiniões e informações expressas são de exclusiva responsabilidade do autor e não obrigatoriamente representam a posição oficial do Canal Solar.





