O setor elétrico brasileiro vive um momento de desafios complexos e demandas urgentes. Essa foi a tônica da 4ª edição do Lefosse Energy Day, realizada no dia 7 de agosto, em São Paulo.
O encontro reuniu executivos, representantes de entidades e especialistas para debater os principais entraves regulatórios e estruturais da matriz energética nacional – com destaque para os temas curtailment, geração distribuída, abertura de mercado, autoprodução e armazenamento de energia.
Curtailment exige solução imediata, afirmam especialistas
O curtailment foi considerado o principal tema a ser enfrentado pelo setor, devido aos impactos diretos sobre investimentos, contratos e segurança jurídica. Para Raphael Gomes, sócio de Energia do Lefosse Advogados, a questão do curtailment é o “primeiro nó a ser desatado”:
“Você quer saber quem vai pagar pelo curtailment. O gerador já está com problemas financeiros, isso pode ser judicializado. E com ações correndo em paralelo, você trava a atuação da agência reguladora. Estamos parando investimentos, inclusive em autoprodução. Como o consumidor vai ter confiança se lê na mídia que há uma usina com 70% de curtailment?”, disse.
A preocupação foi compartilhada por outros participantes, como Pedro Dante, também sócio do Lefosse, ao defender o pragmatismo nas soluções. “Está claro que não teremos uma reforma estrutural no setor. Precisamos simplificar decisões para continuar olhando para o futuro. A abertura do mercado e o armazenamento devem caminhar juntos, pois são respostas à intermitência das fontes renováveis”.
ANEEL: geração distribuída não cabe na Consulta Pública 45
Fernando Mosna, diretor da ANEEL, esclareceu que a geração distribuída não deve ser abordada na terceira fase da Consulta Pública 45, que trata da geração centralizada e sua interação com o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico).
“A CP 45 não tem escopo para tratar de GD. Além disso, a GD tem seu próprio marco legal, a Lei 14.300, que garante o regime de compensação de créditos. Para discutir redução de créditos ou curtailment nesse contexto, seria necessária uma alteração legislativa”, explicou Mosna.
Autoprodução sofre com insegurança trazida por medida provisória
A redação da Medida Provisória 1300 foi alvo de críticas de Mário Menel, presidente da Abiape (Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia) que afirmou que o texto atual ameaça contratos e gera insegurança jurídica.
“A MP foi construída com diálogo com a nossa associação, mas o que saiu não é satisfatório. Ela quebra contratos, traz comandos contraditórios e eleva o risco operacional. Estamos trabalhando para apresentar emendas e dialogar com o relator, a fim de corrigir essas inconsistências”, afirmou.
Abertura e modernização do mercado são prioridade, diz Abracel
Para Rodrigo Ferreira, presidente-executivo da Abracel (Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia), quatro eixos devem guiar a agenda do setor nos próximos anos: formação de preço, segurança de mercado, abertura e sustentabilidade.
“O problema não é falta de tema, é falta de solução. Precisamos entregar energia com segurança e menor custo possível para a sociedade. E essas são as bandeiras que estamos trabalhando todos os dias”, enfatizou.
Armazenamento avança, mas enfrenta barreiras tributárias
O desenvolvimento do armazenamento de energia foi outro ponto debatido com destaque. Segundo Alexandre Oliveira, gerente executivo de Novos Negócios da Auren Energia, o avanço regulatório já ocorre, mas entraves fiscais comprometem a competitividade das soluções.
“Já existe um guidance regulatório, mas o problema é tributário. Chegar a quase 80% de carga tributária inviabiliza uma solução que, no mundo, tem 3 TWh de produção. É preciso pensar com carinho como tratar isso no Brasil para garantir competitividade e diversidade de soluções”, ressaltou.
Futuro exige flexibilidade e digitalização
Oliveira também alertou para a necessidade de antecipar discussões sobre a flexibilidade energética, não apenas em nível de infraestrutura, mas também de software e distribuição.
“O futuro do mercado será baseado em flexibilidade e capacidade, tanto em alta quanto em baixa tensão. Precisamos pensar desde já na superestrutura digital que permita novos produtos elétricos no varejo”, comentou.
Consenso sobre urgência e pragmatismo
A partir das falas e provocações dos painéis, formou-se um consenso entre os especialistas: o setor precisa de respostas concretas, menos sobreposição de normas e mais clareza para investidores, consumidores e operadores.
“Temos uma grande oportunidade. Mas, para aproveitá-la, é preciso parar de empilhar problemas e começar a resolvê-los com base na nossa realidade”, finalizou Pedro Dante.
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