Especialistas contestam versão de que baterias não estão aptas para leilão

Executivos argumentam que a tecnologia já é utilizada em outros países e que regulamentação não é uma barreira
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Especialistas contestam versão de que baterias não estão aptas para o leilão
Segundo especialistas, a tecnologia é madura e confiável. Foto: ISA CTEEP/Divulgação

Em um intervalo de três meses, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, apresentou duas versões sobre a participação das baterias no Leilão de Reserva de Capacidade. 

Em 21 de março, em Houston, nos EUA, ele sinalizou que incluiria a tecnologia no certame, mas em junho voltou atrás ao declarar que a solução ainda apresenta desafios tecnológicos e regulatórios.

No entanto, especialistas ouvidos pelo Canal Solar contestam a posição do ministro.

Para Silvia Wada, diretora-executiva de Finanças e Relações com Investidores da ISA CTEEP, os sistemas com baterias (BESS-Battery Energy Storage System) são uma tecnologia madura e confiável, já utilizada para atender as necessidades sistêmicas de países como Estados Unidos, Austrália, Inglaterra e Itália. 

“Inclusive, conforme reconhecido pelo MME, durante workshop promovido no último dia 24 de maio, o BESS acoplado (híbrido) ou desacoplado (stand-alone) de geração renovável não controlável apresenta atributos técnicos complementares às demais alternativas tecnológicas (usinas térmicas e hidrelétricas) presentes na consulta pública inicial das diretrizes do LRCAP (Leilão de Reserva de Capacidade na forma de Potência) de 2024″, disse Wada.

Em 8 de março, o MME abriu a Consulta Pública nº 160 para discutir as diretrizes do LRCAP. A consulta, que deveria encerrar em 28 de março, teve seu prazo estendido até 26 de abril. Desde então, o mercado aguarda o resultado das contribuições.

O certame está previsto para acontecer em 30 de agosto, mas já há indícios de que não haverá tempo hábil para cumprir o prazo, o que pode deslocar a realização do leilão para setembro ou outubro.

Na visão da ISA CTEEP, é crucial a emissão de uma regulação específica para BESS, cuja publicação da primeira parte é esperada pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) até dezembro de 2024.

No entanto, a empresa também avalia que seriam necessárias apenas pequenas adequações no normativo das usinas híbridas para incluir BESS híbrido no LRCAP 2024.

A empresa possui experiência prática no uso de baterias para armazenamento de energia desde 2022, com um projeto na Subestação Registro, com capacidade de 60 MWh.

Essa tecnologia aumenta a confiabilidade durante picos de consumo no Litoral Sul paulista, especialmente no verão, reforçando a rede elétrica, reduzindo o carregamento de linhas na região e assegurando fornecimento adicional por até duas horas.

“O BESS de Registro evitou o consumo de cerca de 350 mil litros de óleo diesel em dois anos de operação, ao prescindir do uso de geração a diesel, que era a solução alternativa para a região”, destacou Wada. 

Desde a inauguração do sistema, foram realizados mais de 40 despachos de energia armazenada. Para a empresa, “os sistemas de armazenamento possuem excelentes atributos a serem agregados ao SIN (Sistema Interligado Nacional), e a ISA CTEEP tem interesse em desenvolver novos projetos de armazenamento, bem como outras inovações tecnológicas.”

Segundo Markus Vlasits, presidente da ABSAE (Associação Brasileira de Soluções de Armazenamento de Energia), os sistemas de armazenamento possuem ao menos quatro atributos principais:

  • Polivalência: BESS atuam como fonte ou carga, dependendo da situação, absorvendo excedentes de geração renovável e injetando potência quando necessário.
  • Celeridade: o tempo de acionamento de um BESS é inferior a 0,5 segundos, enquanto usinas tradicionais demoram minutos ou até horas. Devido a essa celeridade, BESS são usados para regulação de frequência e tensão em tempo real, via despachos automatizados.
  • Flexibilidade locacional: BESS não dependem de gasodutos, disponibilidade de água ou outros recursos, podendo ser instalados onde são mais úteis para o sistema elétrico.
  • Prazo de implementação reduzido: o BESS na subestação de Registro (60 MWh) foi implementado em cerca de 12 meses, enquanto outras obras do setor elétrico, exceto solar, têm prazos muito mais longos.

Sérgio Jacobsen, CEO da Micropower Energia, expressou surpresa com a declaração do ministro de que a tecnologia não está madura. “Não precisamos de uma regulamentação específica para o LRCAP. A bateria associada a uma usina solar tem o mesmo efeito de uma usina térmica.”

Comercialmente, segundo especialistas, a tecnologia pode competir com outras soluções sem subsídios, entregando os mesmos atributos de uma térmica movida a combustível fóssil.

“É difícil conceber que uma renovável não participe de uma contratação que vai de 2028 a 2043, quando o resto do mundo está descarbonizando a matriz”, afirmou Jacobsen.

Carlos Brandão, presidente da ABAQUE (Associação Brasileira de Armazenamento e Qualidade de Energia), destacou que a entidade trabalha na regulamentação do armazenamento de energia no Brasil desde 2015. “É inexplicável que, em nove anos, o Brasil não tenha avançado e agora, em 2024, ainda falta regulamentação.”

Ele afirmou que sistemas de baterias podem competir com outras fontes, uma vez que a tecnologia custa US$ 100/MWh. “Defendemos a ausência de subsídios, permitindo que todas as fontes concorram igualmente no leilão de capacidade”, argumentou Brandão. 

Estima-se que cerca de 40 GW de sistemas de armazenamento com baterias estejam instalados no mundo, conforme a ABAQUE.

Segundo a TR Soluções, uma empresa especializada em tecnologia para o setor elétrico, cerca de 4 GW serão contratados no leilão para entrega em 2027 e os restantes 3,5 GW em 2028.

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Imagem de Wagner Freire
Wagner Freire
Wagner Freire é jornalista graduado pela FMU. Atuou como repórter no Jornal da Energia, Canal Energia e Agência Estado. Cobre o setor elétrico desde 2011. Possui experiência na cobertura de eventos, como leilões de energia, convenções, palestras, feiras, congressos e seminários.

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