Ela está em tudo — do simples ato de acender uma lâmpada até a complexa engrenagem que movimenta hospitais, indústrias e sistemas de comunicação. Sem energia, a sociedade moderna simplesmente não funciona.
Mas há um ponto crucial: como garantir que esse recurso vital continue disponível diante das mudanças climáticas e dos eventos extremos que já começam a se tornar rotina?
É nesse contexto que surge a geração distribuída, um modelo que permite ao consumidor produzir sua própria energia, geralmente por meio da geração solar fotovoltaica, e que se mostra essencial para a resiliência do setor elétrico.
No Brasil, essa história começou timidamente em 2012, quando a ANEEL publicou a Resolução Normativa nº 482, abrindo espaço para que consumidores pudessem gerar energia em suas residências e compensar o excedente na rede.
Em 2015, uma nova resolução ampliou as possibilidades, permitindo a geração remota — ou seja, não apenas no local de consumo, mas também em áreas distintas, como fazendas solares. Foi o início de uma transformação silenciosa, mas poderosa.
A evolução tecnológica foi outro fator decisivo. Os primeiros painéis solares tinham baixa eficiência e custos elevados. Os inversores — equipamentos que transformam a energia contínua gerada pelos painéis em energia alternada, compatível com a rede elétrica — também eram limitados.
Hoje, tanto painéis quanto inversores são mais potentes, inteligentes e acessíveis, permitindo sistemas mais fluídos e confiáveis. Essa evolução tecnológica pavimentou o caminho para que a energia solar deixasse de ser um luxo e se tornasse uma alternativa viável e alcançável para milhões de brasileiros.
Mas a trajetória não foi linear. Em 2018, a ANEEL iniciou uma Análise de Impacto Regulatório (AIR), um processo que avalia os efeitos de possíveis mudanças nas regras do setor. O “remédio amargo” que a agência guardava era a cobrança sobre a energia injetada na rede.
Em termos simples: quando o sol está a pico, o gerador envia energia excedente para a distribuidora e, à noite, consome de volta. A proposta da ANEEL era cobrar por essa compensação, tornando o modelo economicamente inviável.
Em 2019, após audiências públicas lotadas de defensores da energia solar, a decisão foi pela pior alternativa: cobrar integralmente. O resultado seria desastroso para o mercado nascente.
O que poucos percebem é que a pandemia mudou esse destino. Com o lockdown — período em que atividades foram suspensas para conter o avanço da Covid-19 — os prazos regulatórios também foram suspensos.
A deliberação da ANEEL ficou congelada. Enquanto isso, uma combinação de fatores impulsionou o setor: juros historicamente baixos (2% ao ano contra os atuais 15%), bancos ávidos por emprestar, crise hídrica e risco de apagão, além do aumento do consumo doméstico.
As contas de energia dispararam e milhares de pessoas, com seus negócios fechados, viram na energia solar uma oportunidade de negócio. Nasceram milhares de empresas e centenas de milhares de empregos. Foi uma tempestade perfeita — desta vez, positiva.
Ainda assim, a ANEEL estava pressionada pelo TCU para retomar os prazos. O setor reagiu. Em junho de 2020, ocorreu a manifestação “Brasil, diga sim à energia solar”, reunindo cerca de 700 pessoas de 20 estados em Brasília — a única manifestação pública durante a pandemia.
A pressão política, a mídia e as manifestações levaram à aprovação do Marco Legal da Energia Solar (Lei 14.300/22). A lei não agradou a todos, mas foi necessária para organizar cronogramas e dar previsibilidade ao mercado. Foi um divisor de águas.
Nesse período intenso, participei de audiências públicas, palestras, entrevistas e viagens pelo Brasil. Mais do que falar, atuei como ativista pela defesa da Geração Distribuída. Minha preocupação era dupla: empresas fechando por insegurança regulatória e distribuidoras inertes, sem investir na modernização da rede elétrica.
Essa modernização é vital: uma rede inteligente e preparada para receber energia distribuída favorece a sociedade, reduz perdas, aumenta a resiliência e democratiza o acesso à energia.
Hoje, a Geração Distribuída está estruturada, mas ainda precisa de defesa. Grandes geradores e comercializadores tentam capturar consumidores com contratos que prometem ganhos econômicos, mas não é isso que a sociedade precisa.
O verdadeiro benefício está em gerar energia próxima ao consumo — em telhados, estacionamentos, propriedades rurais — e não em megaempreendimentos bilionários que concentram poder e fragilizam o sistema.
Encerro este artigo com otimismo. A sociedade está despertando para a importância de gerar a própria energia não apenas como economia na conta, mas como um verdadeiro grito de liberdade. A Geração Distribuída é mais do que uma tecnologia: é um movimento social, uma resposta às crises e uma aposta no futuro. Que essa luz siga acesa e que tenha vida longa.
Todo o conteúdo do Canal Solar é resguardado pela lei de direitos autorais, e fica expressamente proibida a reprodução parcial ou total deste site em qualquer meio. Caso tenha interesse em colaborar ou reutilizar parte do nosso material, solicitamos que entre em contato através do e-mail: redacao@canalsolar.com.br.