A GD (geração distribuída) não é resumo de goela‑abaixo de discurso técnico ou tendência de nicho: representa a democratização do acesso à energia.
Quando uma residência, uma escola ou uma comunidade instala painéis solares conectados à rede, ela passa de consumidora passiva para agente produtor de energia — reduzindo sua conta, injetando excedente, aumentando resiliência e aliviando a carga no sistema centralizado. E ainda contribui ativamente para a transição energética, diminuição de emissões e fortalecimento da economia local.
Mas, no Brasil, vemos hoje um duro ataque institucional contra esse modelo. A Medida Provisória 1304/2025 é apenas o exemplo mais recente. O setor debatia‑se ainda com limitação de regras e incentivos, e agora surge uma narrativa que pinta a GD como “injusta”: dizia‑se que “o rico coloca energia solar no telhado e o pobre é quem paga a conta”.
Essa falácia retórica transforma uma inovação democrática num pretexto para defender o status quo —convém desconstruí‑la.
Em primeiro lugar, que fique claro: subsídios são prática corrente no setor elétrico. Desde a CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) até isenções para grandes consumidores, o sistema centralizado tem sempre cruzado subsidiações – umas mais visíveis, outras ocultas. Portanto, argumentar que a GD é ilegítima por “subsidiar ricos” é no mínimo hipocrisia.
Em segundo lugar: chamar de “injustiça” permitir que alguém gere sua própria energia porque “o pobre paga” é uma violação ética e social. A construção desta narrativa já contaminou o tecido social: há quem fale em “racismo energético” como se gerar energia limpa fosse privilégio de ricos — quando, na verdade, o que se busca é empoderamento igualitário.
A tecnologia já alcançou as classes menos favorecidas e inclusive entra em programas sociais como o Minha Casa Minha Vida. O verdadeiro risco é que, se eliminarmos a GD do mapa, serão precisamente os segmentos sociais vulneráveis que ficarão presos a um sistema elétrico centralizado, sujeito a apagões, precariedade tarifária e dependência de poucas grandes empresas.
Encontramos o paradoxo: estados e instituições dizem que querem “modernização do setor elétrico”, “energia limpa” e “resiliência climática”, mas depois aprovam normas que reduzem o estímulo à GD. É puro contrassenso.
É também uma covardia contra os que acreditaram que poderiam fazer sua parte — individualmente e coletivamente.
Portanto, cabe uma clareza moral: a narrativa que culpa a GD por “injustiça social” é fachada para proteger o oligopólio energético.
O pobre não é quem paga por colocar placas no telhado — é quem permanece sem acesso, sem autonomia e sem poder para gerar sua própria energia. A GD, ao contrário, é poderosa ferramenta de inclusão.
Se queremos de fato uma transição justa, precisamos defender a GD como direito — e não aceitar que seja desmontada por lobbies. Investir em microrredes, redes inteligentes e eficiência descentralizada é a tecnologia da vez. Será muito triste se o Brasil perder esse salto por conta de quem quer manter o cidadão preso ao passado.
Em suma: ou defendemos a geração distribuída e liberamos seu pleno potencial ou continuaremos com sistema fechado, desigual e vulnerável.
O momento exige escolha. E essa escolha é de todos — governos, empresas, sociedade civil e cidadãos. A transição não será feita para nós sem nós.
Agora, retomando a MP 1304/2025: essa medida carrega uma armadilha séria. Em seu rastro, está o risco de criminalizar a GD ou limitar severamente o acesso.
Quem de fato sairá perdendo? Sim, os mais pobres. Porque sem a GD, a democratização energética recua — e as classes mais favorecidas seguirão com contratos, geradores ou rede própria, enquanto a maioria continuará dependente das falhas estruturais.
Qual o papel da GD? Funciona assim: você instala geração própria (solar, biogás, baterias), reduz seu consumo da rede ou injeta excedente, com créditos ou tarifas de compensação.
Isso reduz perdas de transmissão, melhora resiliência e facilita a integração de redes inteligentes e microrredes. Em outras palavras, é tecnologia de ponta, participação cidadã e sustentabilidade — tudo junto.
Mas o que se está tentando manter é o modelo tradicional: geração centralizada, tarifas definidas por poucos, subsídios ocultos, risco de apagão e grande controle empresarial.
Se formos fiéis ao espírito da transição energética — que envolve redes inteligentes, geração distribuída, microrredes, flexibilidade e tecnologia — a GD deve ser o centro, não o alvo.
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