É a segunda vez que participo de uma COP. A primeira foi em Dubai. Agora, em Belém (PA). Não foi planejado. Foi de última hora, no meio de muito trabalho com os parceiros 3E e Revolusolar. Ao chegar, fiquei verdadeiramente emocionado com o que encontrei.
Passamos dois anos ouvindo que Belém não tinha capacidade, que o Brasil não ia dar conta, que seria um fiasco. A narrativa era sempre a mesma: desqualificar. E, ironicamente, o improviso virou virtude.
A cidade recebeu, funcionou e mostrou o que grande parte do país teima em não enxergar. Belém tem desafios conhecidos de qualquer região que vive desigualdade estrutural. Aeroporto, logística, calor intenso.
Ainda assim, o que encontrei aqui foi encantador. A hospitalidade do povo, a energia das ruas, a vida acontecendo em todos os cantos. Depois de Dubai, com sua potência e ostentação, desembarcar na Amazônia mostra uma diferença nítida: aqui tem gente, tem diversidade, tem realidade.
A COP é dividida em duas áreas. A Blue Zone é o espaço diplomático, restrito, onde governos e delegações negociam acordos. Tem credenciamento rigoroso, segurança, barreiras claras de acesso.
A Green Zone é o espaço aberto, onde sociedade civil, organizações, comunidades, universidades, empresas e iniciativas territoriais se encontram para apresentar ideias e discutir soluções reais. E foi justamente na Green Zone que a diferença entre Dubai e Belém ficou evidente.
Em Dubai, o acesso à Green Zone tinha credenciamento complexo, filas, controle de entrada e até necessidade de estar vinculado a algum país ou organização. Em Belém, a Green Zone é viva e aberta.

Salas autogerenciadas, circulação livre, gente de todos os lugares. Ministros e autoridades compartilhando o mesmo espaço que crianças, lideranças indígenas, moradores de comunidades remotas, representantes da Califórnia e ribeirinhos da Amazônia. A cidade colocou o povo dentro da COP, e isso muda tudo.
O avanço do armazenamento
E antes mesmo do início da COP, já vínhamos de semanas importantes para o setor elétrico brasileiro e para nossa transição energética. A MP 1.304/2025 trouxe bases estruturais para modernizar o setor e avançou num ponto esperado há anos: reconhecer o armazenamento dentro da arquitetura oficial do sistema elétrico.
A medida tira as baterias do limbo regulatório e cria condições para que elas passem a atuar em reforço de rede, modulação de demanda, integração com renováveis e apoio a regiões isoladas.
É um avanço porque coloca o armazenamento na agenda e abre caminho para destravar projetos, mesmo que as regras operacionais ainda dependam de regulamentação posterior.
Esse movimento, somado ao anúncio do Leilão de Reservas de Capacidade de Baterias, mostra que o país começa a tratar o armazenamento como parte estratégica da infraestrutura.
Na COP, esses temas ganharam escala. A discussão sobre política energética, transição e demanda apareceu em praticamente todos os espaços. O Brasil precisa atrair crescimento para consumir a energia renovável que já produz. Precisamos de indústria, data centers, cadeias produtivas novas. É isso que puxa a demanda e dá racionalidade ao sistema.
Três pontos ficaram evidentes. Baterias como elemento central da segurança energética. Demanda como motor de desenvolvimento. Flexibilidade como base para um mercado competitivo, com preços que variam conforme o horário e trazem eficiência.
Belém também abriu espaço para revisitar a nossa trajetória. O Proálcool faz 50 anos. Agora, iniciativas como o MOVER apontam para rotas híbridas entre etanol e bateria. A transição energética brasileira tem história, base e potencial para seguir evoluindo com consistência.
Outro ponto marcante foi a presença das soluções descentralizadas. Universalização, hibridização das usinas na Amazônia, energia solar com bateria para comunidades isoladas, projetos de desenvolvimento econômico baseados na bioeconomia local. Para quem vive em regiões remotas, transição não é discurso. É sobrevivência. E a estabilidade depende diretamente do armazenamento.
O trabalho da nossa parceira FAS (Fundação Amazonas Sustentável), com quem atuamos no Projeto Sempre Luz levando energia a comunidades remotas da Amazônia com sistemas de baterias da UCB Power, reforçou essa percepção com um levantamento feito junto a 160 comunidades ribeirinhas.
Três perguntas guiaram o estudo: o que é a mudança climática? Qual a maior dificuldade? E qual a solução. A maior parte das respostas apontou para “energia”. E energia limpa. O resultado virou um documento entregue ao presidente da COP.
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E é por tudo isso que eu fecho essa experiência com uma convicção simples. Belém não mudou por causa da COP. A COP mudou por causa de Belém.
Quem reclama que está quente precisa lembrar que Belém sempre foi quente. Não dá para discutir mudança climática sem sentir o desconforto. Possivelmente, lá dentro da Zona Azul, o ar-condicionado não teve trégua.
Mas, em algum momento, todos os engravatados tiveram de sentir o calor, e só existe mudança quando existe desconforto. Belém fez todo mundo sentir isso.
Saio daqui emocionado e orgulhoso. E com ainda mais convicção de que a cabeça não pensa onde o pé não pisa.
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