O Brasil vive hoje uma guerra pública e silenciosa entre dois modelos de geração de energia elétrica: a geração centralizada e a geração distribuída. A recente aprovação da Medida Provisória 1304, intitulada “modernização do setor elétrico”, escancarou esse conflito. Apesar do nome, a proposta representa um retrocesso oligopolista, favorecendo grandes grupos econômicos e ameaçando o avanço de um modelo mais democrático e sustentável.
A geração centralizada é aquela em que a energia é produzida em grandes usinas — hidrelétricas, termelétricas ou parques eólicos — e distribuída por extensas redes até os consumidores. Já a geração distribuída ocorre quando o próprio consumidor gera sua energia, geralmente por meio de painéis solares instalados em telhados de residências, comércios ou propriedades rurais. Esse modelo tem crescido exponencialmente no Brasil, com milhões de sistemas fotovoltaicos instalados e milhares de pequenas empresas atuando no setor.
Essas empresas, todas com menos de uma década de existência, apostaram seu capital, conhecimento e propósito na construção de um novo paradigma energético. Hoje, a geração distribuída é responsável por mais de 2 milhões de sistemas conectados à rede e gera cerca de 300 mil empregos diretos e indiretos em todos os municípios brasileiros. É uma revolução silenciosa que descentraliza o poder energético e fortalece a resiliência das comunidades.
No entanto, essa revolução incomoda. Narrativas distorcidas têm sido propagadas para desacreditar a energia solar, rotulando-a como “coisa de rico”, acusando-a de promover “racismo energético” ou de se beneficiar de “subsídios cruzados”. Esse discurso seletivo esconde a hipocrisia de quem teme a perda de controle sobre o setor elétrico. A verdade é que a geração distribuída democratiza o acesso à energia, reduz custos, aumenta a segurança energética e contribui diretamente para a descarbonização da matriz.
A resistência da geração centralizada é compreensível: o modelo distribuído é disruptivo. Ele rompe com a lógica verticalizada do setor elétrico e propõe um sistema descentralizado, digitalizado, desregulamentado e descarbonizado. Imagine um país onde a energia é negociada de ponta a ponta, entre consumidores e produtores locais, sem intermediários. Essa é a visão que apresentei na Latinoware, congresso de tecnologia aberta no Paraná, ao propor a energia como um “código aberto”, onde todos podem gerar, consumir e comercializar livremente.
Explicar isso para jovens é fácil. Eles entendem a lógica da descentralização, da autonomia e da inovação. Já para quem enxerga o setor elétrico apenas como um sistema robusto e fechado, essa ideia parece utópica. Mas não é. Os recursos energéticos distribuídos — como painéis solares, baterias, veículos elétricos e sistemas de gestão inteligente — já são realidade. Um exemplo claro é o uso de painéis solares no programa Minha Casa Minha Vida e em escolas públicas, que reduzem custos e liberam recursos para educação.
A verdadeira modernização do setor elétrico não está em mudar o modelo de comercialização, como propõe a MP 1304, mas em preparar a rede de distribuição para integrar esses recursos distribuídos. Isso exige investimentos em tecnologia, regulação inteligente e vontade política. O Brasil tem potencial solar abundante, capacidade técnica e uma sociedade cada vez mais consciente.
Infelizmente, a sociedade ainda está confusa. A guerra entre os modelos energéticos é travada nos bastidores, com termos técnicos e interesses ocultos. Poucos sabem o que está realmente em jogo — e o que é melhor para o país. Mas há uma certeza: o caminho da geração distribuída está trilhado e não pode ser travado. Ele representa o futuro da energia no Brasil e no mundo.
Seguimos com esperança e convicção. A energia do amanhã será livre, limpa e compartilhada. E essa transformação já começou.
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