O aumento expressivo no tempo de resposta das distribuidoras para atender reclamações de falta de energia no Brasil é um tema que merece atenção.
Em 2024, ultrapassamos a marca de 5 milhões de queixas relacionadas à falta de energia, com o tempo médio de atendimento superior a oito horas, muito acima das seis registradas em 2015. Esse retrocesso demanda uma análise aprofundada para compreendermos suas causas e identificarmos soluções.
Em minha experiência no setor, observo fatores internos e externos às distribuidoras de energia elétrica que contribuem para o aumento dos tempos de resposta.
Externamente, tem-se que as tempestades têm sido cada vez mais severas quanto às suas intensidades. Além disso, as cidades têm sido cada vez mais arborizadas sem, ao que parece, estar havendo o adequado controle dessa vegetação.
Por fim, o trânsito nos grandes centros urbanos dificulta muito os necessários deslocamentos das equipes de atendimento para acessarem os locais de ocorrências. Internamente, há a obsolescência da rede elétrica ou sua inadequação ao meio que a cerca, decorrente de padrões de construção ineficazes para a atualidade.
Além disso, a escassez de mão de obra, decorrente da redução de equipes técnicas pelas distribuidoras para controle de custos, comprometeu gravemente a capacidade de resposta a emergências, especialmente em períodos de alta demanda, como tempestades ou outros eventos climáticos extremos.
Desafios regulatórios
O quadro existente exige que a regulação acompanhe as transformações existentes e direcionem o desempenho das empresas de energia elétrica para a solução desejada.
Basicamente, duas são as variáveis para controle dessa situação: a resposta estrutural fazendo reduzir o número de ocorrências e a resposta de recuperação, fazendo com que as ocorrências, uma vez existindo, possam ser resolvidas no prazo mais curto possível.
Assim, a regulação deve ser tal que estimule os investimentos necessários à adaptação da rede elétrica às condições exteriores atuais. Deve ser buscada a equação econômica e tarifária para soluções como o enterramento da rede elétrica, a substituição, em larga escala, das redes existentes por padrões construtivos mais robustos, a automação intensa de rede, etc.
No que se refere às soluções de manutenção da rede e à disponibilidade de equipes para atendimentos emergenciais, deve haver a recalibração dos mecanismos de ganho de produtividade hoje existentes no processo tarifário.
Com efeito, não se discute que as tarifas devam ser as mais módicas possíveis, porém, por outro lado, elas devem espelhar a necessidade real de atendimento aos padrões de qualidade desejados.
A realidade atual é de que há mais pressão de custos sobre as atividades de operação e manutenção da rede e isso conflita com a pretensão de se ter tarifas cada vez menores. O equilíbrio entre essas duas forças é o que deve ser buscado e constitui-se no desafio regulatório de nossos dias.
Para os consumidores, os impactos são imediatos e tangíveis. Longos períodos sem eletricidade comprometem alimentos perecíveis, interrompem o funcionamento de equipamentos essenciais e prejudicam o trabalho remoto, cada vez mais comum.
Essa sensação de abandono mina a confiança no setor e gera tensão entre consumidores e fornecedores. Para as distribuidoras, as consequências também são severas.
Históricos de mau atendimento podem resultar em multas milionárias impostas pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), além de prejudicar a reputação das empresas junto aos investidores. A insatisfação generalizada ainda pode acelerar demandas por regulações mais rigorosas, aumentando os desafios operacionais.
Ciclo virtuoso
Modernizar a infraestrutura é um processo caro e demorado, sobretudo em um cenário econômico desafiador, mas tem que ser enfrentado, pois sem isso não são reduzidas as ocorrências impostas pelo ambiente às redes elétricas.
A solução para esse problema passa por ações coordenadas entre governo, empresas e sociedade. Investimentos em infraestrutura são essenciais, como a substituição de equipamentos obsoletos e a expansão da rede para áreas mais vulneráveis.
Redes subterrâneas são a solução para os desafios climáticos no Brasil?
Redes inteligentes (smart grids) também podem melhorar a eficiência no monitoramento e resposta a problemas, ao reduzirem significativamente os tempos de espera. De outro lado, as distribuidoras devem investir em planos de contingência para lidar com eventos climáticos extremos, com a ampliação de equipes de emergência e aquisição de equipamentos de reposição.
Essas equipes, tão necessárias nos períodos de fortes chuvas e numerosas ocorrências, podem tornar-se demasiadas em outras épocas do ano, mas é exatamente aí que pode haver um ciclo virtuoso, uma vez que as mesmas, em períodos de baixas ocorrências, podem e devem ser direcionadas para fazer mais manutenção na rede elétrica, aumentando sua resiliência e, com isso, reduzindo as ocorrências para o próximo período chuvoso.
Além disso, ferramentas de comunicação eficazes, como aplicativos que informem o status das ocorrências em tempo real, podem mitigar a insatisfação dos consumidores. Por meio dessas medidas, é possível criar um sistema mais eficiente e responsivo, que beneficie tanto os consumidores quanto as distribuidoras.
O setor elétrico brasileiro precisa de soluções concretas e colaborativas para enfrentar os desafios de um futuro cada vez mais dependente de energia confiável e acessível.
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