[gtranslate]

Entenda a determinação do TCU feita à ANEEL e quais serão os próximos passos

Tema ganha relevância devido ao novo processo de revisão da REN 482 que está em curso

Em decisão de seu Plenário, em 18 de novembro, os ministros do TCU (Tribunal de Contas da União) rejeitaram representação (Representação TC 037.642/2019-7) do Ministério Público de Contas, que alega possível ofensa aos Princípios da Segurança Jurídica, da Confiança Legítima e da Boa-Fé na CP 25/2019 (Consulta Pública n.º 25/2019) da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica). Como já é de conhecimento do mercado, no âmbito da referida consulta, debate-se a proposta de alteração da REN 482 e 414 (Resoluções Normativas ANEEL n.º 482/2012 e n.º 414/2010), bem como do Módulo 3 do PRODIST (Procedimentos de Distribuição de Energia Elétrica no Sistema Elétrico Nacional), todos eles normativos aplicáveis à micro e à minigeração distribuída de energia elétrica no Brasil. Os ministros do TCU entenderam de forma objetiva que não há violação aos mencionados princípios, eis que a mudança proposta pela ANEEL na consulta pública não é abrupta ou nova, pois que já sinalizada pela ANEEL, desde 2015. O TCU também não observou vícios de caráter procedimental na CP 25/2019 que pudessem ensejar sua invalidação. Desde 2010, todo o histórico da regulamentação da GD (geração distribuída) no Brasil foi devidamente documentado e publicitado de modo amplo e irrestrito, por vários meios, inclusive no sítio eletrônico da ANEEL. O TCU também considerou que a proposta de nova regra debatida na CP 25/2019 é legal e tenta corrigir “efeitos colaterais e externalidades negativas” das regras de subsídio à micro e minigeração que estavam em vigor. Contudo, pontuou que “eventual política de incentivo à geração distribuída que envolva subsídios tarifários deverá ser estabelecida por lei formal, nos termos do art. 175, parágrafo único, III, da Carta Magna, devendo deixar transparente quem custeia e quem se beneficia dessa política”. A decisão foi no sentido de que a ANEEL não pode decidir sobre subsídio. O Tribunal concedeu à agência prazo de 90 dias para apresentar um plano concreto para eliminar o suposto subsídio cruzado existente na GD, que ocorre em virtude do modelo tarifário existente no Brasil que precisa ser alterado e está em discussão no processo de “modernização” do setor de energia. No mesmo sentido, o TCU recomendou ao Ministério de Minas e Energia que, ante as diretrizes para micro e mini GD a serem expedidas pelo CNPE (Conselho Nacional de Políticas Energéticas), formule um modelo de nova política pública, em substituição ao sistema de compensação atualmente previsto na REN 482, a ser submetido à avaliação do Congresso Nacional. A questão e a urgência sobre o assunto determinada pelo TCU ganham especial relevância considerando o novo processo de revisão da REN 482 que está em curso e que culminará na mudança do sistema de Compensação de Energia atualmente em vigor, havendo a expectativa do setor que essa revisão seja concluída no primeiro semestre de 2021. Referido processo de revisão tem como objetivo um aprimoramento da norma de modo a verificar a adequação da metodologia de cálculo dos benefícios hoje auferidos pelo consumidor em contraposição com eventual “subsídio cruzado” que estaria onerando aqueles que não possuem geração distribuída, existindo, portanto, uma discussão sobre o aspecto econômico da norma. A revisão da sistemática de compensação de energia é um aspecto importante para as concessionárias de distribuição de energia, que alegam perda de receita pela redução de mercado. Outro argumento utilizado para justificar tal revisão é que os consumidores que não aderiram ou não se beneficiam da opção de gerar sua própria energia, acabam pagando pelos custos de transporte da energia, encargos e perdas, que hoje a “geração distribuída” é isenta pelas regras atuais e legislação vigente. Em paralelo às discussões no âmbito da ANEEL, o Poder Legislativo tem indicado que encaminhará com projetos de lei para regular o marco legal da GD com pontos distintos defendidos pela Agência Reguladora. Nos Projetos de Lei a questão do subsídio cruzado está endereçada e deverá ser enfrentada pelo Poder legislativo. Destaca-se, nesse sentido, o PL 2215 (Projeto de Lei n.º 2.215/2020), do deputado federal Beto Pereira, que propõe critérios bastante diversos em relação àqueles propostos pela ANEEL para a tarifação de GD, baseada em gatilhos de energia injetada na rede em comparação à carga da distribuidora (e não em relação à potência instalada de centrais de GD, como na proposta da ANEEL). A chamada geração remota pura (na qual a geração ocorre em unidade sem carga, por exemplo na geração compartilhada ou autoconsumo remoto) sofreria impactos imediatos com a aprovação do PL, sem período de transição, rompendo com a lógica de transição estabelecida pela ANEEL e impactando os projetos já implantados com arranjos de médio e longo prazo, sob a lógica da REN 482. A mídia também tem noticiado, igualmente, que outro projeto de lei deverá ser apresentado pelo deputado federal Lafayette de Andrada, com regras também distintas da proposta da ANEEL e do PL apresentado pelo parlamentar Beto Pereira, não sendo possível precisar ou comparar qual será eventual texto normativo eventualmente aprovado no Congresso Nacional. Segundo posicionamento recente do deputado: (…) “Não protocolei ainda o projeto de lei que propõe uma nova regulamentação para a GD porque achamos muito mais factível e exequível apresentá-lo como emenda substitutiva em um PL que já esteja tramitando na Casa. Foi o que acordamos com o presidente da Câmara. Além disso, o Legislativo está priorizando o andamento de projetos que se relacionem diretamente com a crise da Covid-19”, esclareceu Andrada”. Dentro das propostas de inclusão na legislação existe o endereçamento do ponto polêmico a respeito do impacto do subsídio indireto da GD, havendo previsão expressa que CDE passa a assumir o impacto do subsídio cruzado da geração distribuída, havendo a cobrança dentro da sistemática já prevista no Mercado Regulado (quem não possui GD irá suportar o aumento indireto da CDE, como já acontece na prática), acabando com toda a polêmica discussão na nossa visão. Parte do setor possui a expectativa que esse projeto de lei “substitua” a REN ANEEL 482, sendo integrado ao CBEE (Código Brasileiro de Energia Elétrica), que está sendo criado e cumpriria o papel que hoje cabe à ANEEL por meio de Resolução Normativa. Na prática, o segmento de GD, por ter restrições em relação às propostas da ANEEL, está trabalhando com um marco legal para trazer uma segurança jurídica maior para o segmento, especialmente na questão da transição das regras dos novos regimes de compensação de energia. Vale frisar, por fim, que o TCU recomendou que as alterações da REN ANEEL 482 acerca do “subsídio cruzado” deverão preservar os atos constituídos com base na legislação em vigor e deverá operar para o futuro, estabelecendo prazo de transição com vistas à mitigação dos ônus ou das perdas dos administrados, evitando que sejam anormais ou excessivos. O TCU pontuou que as regras de transição devem ser definidas pela própria ANEEL, o que foi bem recebido pelo segmento que aguarda uma posição mais serena da agência reguladora sobre o tema do que ocorreu com o encerramento da última Consulta Pública sobre o tema, sendo indiscutível que a ANEEL possui atribuição e competência técnica para revisar a norma que viabilizou o segmento no país. O grande ponto de incerteza é que não é possível precisar o que ocorrerá primeiro. A alteração da REN 482 no âmbito da ANEEL, ou a promulgação de uma Lei específica que irá disciplinar sobre o instituto da geração distribuída no País, o que pode gerar contradições entre os dispositivos dos dois institutos se não existir um alinhamento entre as instituições do setor de energia e o Congresso Nacional. Na visão da equipe de energia do escritório de advocacia Demarest, a definição concreta sobre os rumos e o futuro da geração distribuída no Brasil é fundamental para criar um ambiente atrativo para os investimentos em GD, com um mercado dinâmico, sustentável e, principalmente, que possa operar dentro da mais profunda segurança jurídica. Existe uma janela de oportunidade para a estruturação de projetos dentro da sistemática atual de compensação de energia, devendo ser adotadas cautelas necessárias para a mitigação de riscos em razão da indefinição do tema que ainda está em aberto e deve ser concluído no primeiro semestre do próximo ano.


Este é um artigo de opinião e não traduz necessariamente a opinião do Canal Solar. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate de temas relacionados ao mercado fotovoltaico.

Picture of Pedro Dante
Pedro Dante
Sócio da área de energia da Lefosse Advogados. Presidente da Comissão de Estudos de Regulação do Instituto Brasileiro de Estudo do Direito de Energia. Coordenador do Comitê de Energia e Arbitragem da Câmara de Arbitragem Empresarial. Árbitro na Câmara de Medição e Arbitragem do Oeste da Bahia. Membro efetivo da Comissão de Direito da Energia da OAB/SP. Advogado especializado em assuntos regulatórios relacionados ao setor de energia elétrica com mais de 19 anos de atuação no setor.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Receba as últimas notícias

Assine nosso boletim informativo semanal

Baixe Agora Seu Exemplar!

Preencha os dados acima e receba seu exemplar gratuito da Revista Canal Solar.

Baixe Agora Seu Exemplar!

Preencha os dados acima e receba seu exemplar gratuito da Revista Canal Solar.