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Qualidade dos sistemas fotovoltaicos no Brasil e as normas técnicas

As normas técnicas são essenciais para garantir a boa qualidade dos sistemas

Autor: 9 de dezembro de 2020junho 24th, 2022Artigos técnicos
9 minutos de leitura
Qualidade dos sistemas fotovoltaicos no Brasil e as normas técnicas

O crescimento da geração solar fotovoltaica depende da sua competitividade frente a outras formas de geração de energia, o que envolve a manutenção de  padrões mínimos de eficiência, confiabilidade e segurança dos sistemas fotovoltaicos. A boa qualidade desses sistemas é fundamental para que investidores direcionem seus recursos para esse setor, já que ela está diretamente envolvida com os parâmetros de avaliação econômica utilizados na tomada de decisões sobre alocação de recursos. Em engenharia qualidade é algo objetivo e mensurável, podendo significar em sistema fotovoltaico eficiência, confiabilidade e custo de ciclo de vida [1]. Através de normas técnicas são estabelecidos requisitos mínimos de segurança e desempenho, que todos os serviços ou produtos fornecidos no país devem seguir (Figura 1). Desta forma, a qualidade dos sistemas fotovoltaicos existentes no Brasil está diretamente ligada à sua adequação às normas técnicas ABNT ou, na ausência delas, a normas internacionais [2] aceitas no Brasil, como as normas IEC. Apesar de as normas técnicas da ABNT não serem leis, elas são utilizadas pelas normas regulamentadoras do Ministério da Economia e pelo código de defesa do consumidor, o que lhes confere poder e efetividade.

Figura 1: As normas técnicas da ABNT estabelecem requisitos mínimos de desempenho e segurança dos produtos e serviços utilizados no Brasil

A qualidade pode ser definida de uma forma subjetiva como a percepção individual ou coletiva sobre a satisfação obtida com uma dada situação [3]. Esta percepção é influenciada pela cultura, pela educação, pelo momento e pela expectativa. A necessidade de quem avalia interfere na avaliação da qualidade. Por isso, o surgimento do conceito de qualidade percebida, que é caracterizada por um alto grau de subjetividade, ao contrário da qualidade objetiva, e a sua existência pode ser motivo de divergência entre pessoas envolvidas no mesmo processo de avaliação, pois ao ser subjetiva ela pode existir para uns e não para outros, ou existir em diferentes graus de avaliação. Objetivamente a qualidade corresponde à conformidade de um produto ou serviço às exigências estabelecidas previamente por quem o irá utilizar. A qualidade objetiva deve necessariamente permitir a sua comprovação através de parâmetros mensuráveis, sendo por isso que as empresas investem na gestão da qualidade, procurando atingir índices estabelecidos nas normas técnicas NBR ISO 9001:20015 e NBR ISO 14000:2015. Por mais intuitivo que seja o conceito de qualidade para os consumidores, já que certamente preferem possuir produtos de qualidade, é necessário distinguir entre os conceitos de valor e qualidade, já que o valor de um produto ou serviço é determinado pelos clientes como resultado da percepção que eles possuem dos benefícios que algo lhes proporciona, descontado os recursos necessários para obtê-lo. Desta forma, a qualidade percebida é o julgamento do consumidor sobre as vantagens trazidas por um produto ou serviço, sem considerar os recursos necessários para obtê-los e se esta troca seria ou não justa. Por isso, um sistema fotovoltaico, por exemplo, poderia ser percebido pelos consumidores como de alta qualidade, mas de baixo valor ou, embora menos provável, de baixa qualidade, mas de alto valor [4]. Embora o conceito de valor percebido ainda seja relativamente recente, muitos atores do setor fotovoltaico acreditam que a qualidade e o valor percebido pelos usuários de sistemas fotovoltaicos, os prosumidores (unidades consumidoras que possuem geração própria), significam a mesma coisa e se a qualidade for aumentada ocorrerá o  aumento imediato do valor percebido. É possível afirmar que esta ideia não é correta e o crescimento da geração fotovoltaica no Brasil não será fruto de voluntarismo, mas sim de políticas públicas, em que aspectos ligados ao estabelecimento de padrões mínimos de qualidade terão um papel fundamental. Embora a geração fotovoltaica seja vista como positiva e ambientalmente amigável, atualmente não é possível afirmar se e quanto os consumidores estariam dispostos a pagar a mais pelo consumo de energia gerada através de sistemas fotovoltaicos. Uma pesquisa realizada na Austrália demonstrou que os consumidores daquele país prefeririam se hospedar em hotéis cuja energia fosse fornecida por fontes renováveis, devido aos aspectos ambientais envolvidos. Mas ela também indicou que esses mesmos clientes não se disporiam a pagar diárias mais caras por isso, ou no máximo admitiriam pagar um pouco mais nesse caso. Como a qualidade objetiva não é algo abstrato, ela depende de fatores físicos e institucionais bem definidos como um sistema legal eficiente, capital humano e infraestrutura adequada. Esta cadeia da qualidade envolve a formação de mão de obra, elaboração de normas técnicas e criação de uma rede de fornecimento competitiva. Para que esses elementos floresçam é fundamental o engajamento de agentes públicos, faculdades de engenharia, centros de pesquisa, empresas privadas e associações profissionais. O setor de geração solar fotovoltaica brasileiro ainda carece de indicadores quantitativos de qualidade. Fornecedores de produtos ou serviços não disponibilizam informações que possam comprometer a reputação de seus produtos, entidades certificadoras não estão acessíveis aos consumidores e a tecnologia muda tão rapidamente que não permite a consolidação de algumas soluções. Ao mesmo tempo, como o projeto e a instalação são duas das principais causas de falhas em sistemas fotovoltaicos, seria extremamente importante a existência de mecanismos suficientemente ágeis para punir empresas e profissionais que forneçam serviços sem um mínimo de qualidade. Por esse motivo, deveria ser instituído um programa de certificação, obrigatória ou voluntária, dos sistemas fotovoltaicos, algo que não prosperou nas instalações elétricas convencionais, em média ou baixa tensão, mas poderia ser implantado para os sistemas fotovoltaicos. Pelo fato de questões como sombreamento, disponibilidade de espaço e posicionamento dos módulos afetarem a eficiência dos sistemas fotovoltaicos, cada projeto deve ser desenvolvido cuidadosamente, sendo fundamental a capacidade profissional do projetista responsável (Figura 2). Neste caso, será muito importante avaliar a relação entre o valor pago pelo projeto e o custo de ciclo de vida do sistema fotovoltaico, sem o que o este investimento poderá apresentar resultados negativos.

Figura 2: Vários aspectos devem ser avaliados em um projeto de sistema fotovoltaico

Como sistemas fotovoltaicos com a mesma potência podem apresentar características diferentes, é necessário avaliar cuidadosamente a relação custo-benefício de cada solução adotada, já que uma alternativa mais barata pode ser fruto de componentes de menor durabilidade, ou uma outra mais cara pode significar um sistema fotovoltaico muito mais eficiente, algo que só pode ser avaliado de fato por profissionais qualificados e experientes. Pela importância do fator humano na eficiência e na segurança dos sistemas fotovoltaicos, sem que existam trabalhadores qualificados não é possível implementar sistemas de produção  eficientes, sendo função do setor de educação a formação profissional e o fornecimento da base necessária para sustentar processos tecnológicos que agreguem valor e permitam um crescimento econômico de longo prazo. Esse ponto é fundamental para o setor de energia solar fotovoltaica. Não basta criar mão de obra qualificada para atender a sua demanda, mas também é necessário garantir que seus profissionais não tenham sua remuneração aviltada por uma concorrência predatória, onde pessoas altamente qualificadas sejam preteridas por profissionais sem a formação necessária, que são atraídos por um mercado que se demonstra aquecido (Figura 3).

Figura 3: Qualidade exige investimento continuado em qualificação profissional. Fonte: Canal Solar

Em países desenvolvidos, os mecanismos de mercado são regulados pelo papel fiscalizador do Estado. Caso um profissional provoque danos aos seus clientes, ou à sociedade em geral, ele será punido de forma rápida e proporcional aos danos que provocou, dissuadindo assim a repetição de tais práticas e impedindo que a concorrência, algo saudável, se torne predatória. Pelo que foi exposto, existem travas ao aumento da qualidade dos sistemas fotovoltaicos no Brasil, porque muitas questões estão além das possibilidades dos profissionais desse segmento, envolvendo mudanças estruturais no país. Mesmo assim, existe um amplo campo de ações que podem ser feitas pelos agentes do setor, para que o crescimento do setor de energia solar fotovoltaica no Brasil crie toda a riqueza que ele tem potencial para gerar.

Referências

  • [1] JANNUZZI, Gilberto de Martino; SWISHER, Joel; REDLINGER, Robert. Planejamento Integrado de Recursos Energéticos. Oferta, demanda e suas interfaces. International Energy Initiative (IEI) Brasil. Campinas 2018.
  • [2] Normas internacionais não são normas de qualquer país utilizadas sem nenhum critério. O Brasil reconhece como válidas, na ausência de normas nacionais especificas, as normas técnicas do Mercosul ou da IEC
  • [3] GOMES, Paulo J.P. A evolução do conceito de qualidade: dos bens manufacturados aos serviços de informação. Cadernos Bad, v.2004, n.2, p6-18, 2004.
  • [4] SANTOS, Sergio Roberto Silva. Estudo da relação entre o valor de venda e a qualidade percebida: uma aplicação aos dispositivos de proteção contra surtos. Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro de Ciências e Tecnologias para a Sustentabilidade da Universidade Federal de São Carlos, campus Sorocaba, para obtenção do título de Especialista em Economia & Negócios. Sorocaba, São Paulo. 2017.
Sergio Roberto Santos

Sergio Roberto Santos

Engenheiro eletricista da Lambda Consultoria. Formado pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), com especialização em economia e negócios (MBA) pela UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos). Atualmente, é mestrando em tecnologia da energia no Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (IEE-USP).

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