Transição energética: avanços, desafios e lições para 2025

Recordes em tecnologias limpas contrastam com gargalos em mercados maduros e emergentes, exigindo estratégias mais equilibradas
Transição energética avanços, desafios e lições para 2025
Transição energética global está cada vez mais marcada pela competição geoeconômica. Foto: Freepik

Apesar das conquistas em energia limpa, como recordes em capacidade instalada de fontes renováveis, uma alta expressiva nas vendas de VEs (veículos elétricos) e a expansão de novas tecnologias de armazenamento de energia no mundo, a jornada para a transição energética está longe de ser simples. Essa é a avaliação de Albert Cheung, chefe de Análise de Transição Global da BNEF (BloombergNEF).

“Trabalhar com energia limpa e clima é viver em um estado constante de dissonância cognitiva, preso entre boas e más notícias. O lado bom é que todo ano traz crescimento contínuo nas indústrias de tecnologia limpa, níveis recordes de investimento e avanços tecnológicos constantes”, destacou.

“No entanto, apesar de anos de aceleração contínua e rápida, nunca é o suficiente. A cada inverno, os analistas da BNEF passam semanas calculando números apenas para concluir que o investimento global em transição energética está bem abaixo do nível necessário para entrar no caminho do zero líquido até meados do século”, ponderou Cheung.

Para este ano, ele elencou uma série de fatores que podem impactar diretamente a trajetória dos países em direção às suas metas de net zero. Entre os desafios apontados estão a chegada do governo Trump, que pode alterar políticas climáticas nos Estados Unidos, e a desaceleração do crescimento das vendas de veículos elétricos.

Além disso, mencionou as dificuldades do setor de baterias da Europa, o progresso limitado no hidrogênio e na descarbonização industrial, as dificuldades contínuas no setor eólico offshore e o acordo financeiro da COP29 que deixou muitos países decepcionados.

De acordo com o especialista, essa sensação de desconforto traz cinco lições importantes que a sociedade deve absorver ao iniciar um novo ano de trabalho na transição energética.

1. A transição energética não vai abrandar

A transição para energias limpas continua acelerada, com 2024 marcando um forte crescimento em várias tecnologias. As instalações solares fotovoltaicas cresceram 35%, o armazenamento de energia, em termos de megawatt-hora, subiu 76% e as vendas de veículos elétricos aumentaram 26% em relação ao ano anterior, segundo estimativas da BNEF. 

“E o efeito Trump? As previsões atualizadas apontam que, em 2030, os veículos elétricos representarão um terço das vendas de novos veículos nos Estados Unidos — quase três vezes a participação atual no mercado. Embora esse número esteja abaixo da penetração de 48% esperada sob as regulamentações da era Biden, ainda representa um crescimento significativo”, enfatizou o analista. 

Quanto à energia limpa, são esperados mais de 900 GW de novos empreendimentos fotovoltaicos, eólicos e soluções de armazenamento nos EUA até 2035 – em um cenário em que os créditos fiscais de investimento e produção sejam totalmente revogados.

  1. Esta é a parte difícil da jornada

Na visão de Albert Cheung, o avanço da transição energética agora enfrenta barreiras mais complexas. Em mercados maduros, os primeiros a adotar veículos elétricos e sistemas fotovoltaicos residenciais já capturaram as oportunidades mais fáceis, reduzindo os custos iniciais dessas tecnologias. 

“No entanto, o crescimento em setores como VEs e solar está começando a desacelerar. Em 2024, as vendas de veículos elétricos cresceram 26%, um ritmo mais lento do que os 60% e 34% registrados em 2022 e 2023, respectivamente. Da mesma forma, o crescimento de instalações fotovoltaicas, que foi de 35% em 2024, deve cair para 11% em 2025, evidenciando que muitos mercados avançados estão atingindo altos níveis de penetração”, relatou.

Para manter o ritmo, será necessário superar gargalos, como aumentar a flexibilidade em redes maduras, desenvolver mercados emergentes com regulamentações deficientes e investir em infraestrutura de carregamento e armazenamento de energia. 

Mercados emergentes como Índia, Paquistão e Romênia têm sido grandes impulsionadores, mas precisam de arranjos regulatórios mais robustos para adoção em larga escala. “O futuro da transição exigirá novas soluções para desbloquear essas oportunidades e abrir caminho para o próximo ciclo de crescimento”, frisou. 

3. Tenha cuidado para não interpretar mal os dados

Conforme o chefe de análise de transição global da BNEF, em um setor tão complexo quanto a transição energética, a interpretação equivocada de dados pode gerar percepções distorcidas. No caso dos veículos elétricos, por exemplo, o crescimento mais lento em 2024 na União Europeia foi amplamente interpretado como uma queda no interesse do consumidor. 

“No entanto, a realidade foi mais sutil: um aumento temporário nas vendas no ano anterior devido ao fim de subsídios criou um efeito de comparação desfavorável. Mesmo assim, a indústria automobilística da UE alcançou as metas de emissões de CO2, mostrando que o mercado já opera em um ritmo suficiente para atender às regulamentações”, afirmou. 

Essa desaceleração temporária reflete um alinhamento estratégico das montadoras, que provavelmente aguardam até 2025 para lançar veículos mais competitivos e alinhados às novas metas de emissões. 

“A lição aqui é clara: o contexto por trás dos números é crucial para entender as dinâmicas do mercado. Dados isolados podem dar a impressão de desaceleração ou falhas quando, na verdade, são parte de ciclos previstos ou estratégias ajustadas ao cenário regulatório”, explicou o especialista. 

4. Uma transição bem-sucedida e lucrativa

A transição energética depende de retornos financeiros que atraiam investidores e empresas. De acordo com Cheung, tecnologias como hidrogênio limpo ainda enfrentam custos elevados, com os preços médios do hidrogênio verde sendo 35% mais altos do que há dois anos. 

“Isso reforça a necessidade de políticas de longo prazo, como subsídios e precificação de carbono, para viabilizar a adoção em setores como fertilizantes, aço e produtos químicos. Os governos devem criar ambientes regulatórios que permitam retornos ajustados ao risco, garantindo que os investimentos em energia limpa continuem atraentes”, enfatizou

O setor de energia eólica offshore exemplifica os desafios de equilibrar custos e incentivos. Leilões competitivos nos últimos anos pressionaram as margens de fabricantes, resultando em projetos cancelados e dificuldades financeiras. 

“Aprender com essas experiências é essencial para estruturar políticas que atraiam aportes sustentáveis, oferecendo estabilidade aos desenvolvedores e retornos financeiros viáveis. O sucesso da transição energética está diretamente ligado à capacidade de criar um equilíbrio entre competitividade, incentivos e viabilidade econômica”, acrescentou o executivo. 

5. A competição geoeconômica tornou-se o maior fator de complicação

A transição energética global está cada vez mais marcada pela competição geoeconômica. Países como EUA, Índia e membros da UE estão implementando políticas para proteger suas indústrias locais de tecnologias limpas, como baterias e painéis solares, ao mesmo tempo em que enfrentam desafios relacionados ao excesso de oferta global, especialmente devido à capacidade de produção da China. 

“Embora essas políticas visem segurança econômica e energética, elas frequentemente aumentam os custos para o usuário final e dificultam a disseminação de inovações globais”, disse. 

Para garantir uma transição bem-sucedida, os formuladores de políticas precisam equilibrar o protecionismo com a colaboração internacional. Parcerias estratégicas, como joint ventures e compartilhamento de expertise técnica, podem ajudar a mitigar os impactos de políticas restritivas, enquanto promovem uma indústria local dinâmica. 

“Além disso, diversificar fontes de tecnologia limpa e evitar exclusões generalizadas de empresas estrangeiras pode reduzir os custos da transição e fortalecer a segurança energética em todo o mundo. O futuro da transição dependerá de decisões políticas estratégicas e equilibradas”, concluiu Albert Cheung.

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Foto de Mateus Badra
Mateus Badra
Jornalista graduado pela PUC-Campinas. Atuou como produtor, repórter e apresentador na TV Bandeirantes e no Metro Jornal. Acompanha o setor elétrico brasileiro desde 2020.

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