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Ajuste das variáveis de saída do módulo FV com medição de temperatura e irradiância

Exemplo de normalização da tensão de circuito aberto e da corrente de curto-circuito de um módulo FV

Autor: 2 de outubro de 2020julho 11th, 2022Artigos técnicos
12 minutos de leitura
Ajuste das variáveis de saída do módulo FV com medição de temperatura e irradiância

Findada a etapa de instalação dos sistemas fotovoltaicos, inicia-se a fase do comissionamento do projeto. Nesta fase, são inspecionadas e averiguadas as conformidades do sistema com as normas regulamentadoras, especialmente a ABNT NBR 16274:2014, além das boas práticas de engenharia. A norma referida possui três ramificações de ensaios:

  • A primeira, que rege uma detalhada inspeção visual de conformidade com o projeto e boas práticas;
  • A segunda, que emprega ensaios elétricos para assegurar que o sistema opere de forma segura e;
  • A terceira, que apresenta ensaios de desempenho.

Devido ao fato de os equipamentos de ensaio de desempenho possuírem um custo relativamente alto, acabam não sendo uma unanimidade entre os profissionais, o que torna inviável que os dados coletados em campo sejam devidamente tratados e analisados como rege a cartilha. Sem um sensor de temperatura e de irradiância, a medição e a análise dos dados ganha empirismo e perde precisão. O instrumento mínimo necessário para medições na etapa de comissionamento de um sistema fotovoltaico resume-se a um multímetro para a medição da tensão de circuito aberto e da corrente de curto-circuito dos módulos ou das strings fotovoltaicas. É possível obter informações preciosas mesmo com um equipamento simples como esse. Entretanto, os dados fornecidos pelos fabricantes de módulos fotovoltaicos são baseados em condições climáticas pré-estabelecidas (STC ou NOCT, como vamos explicar a seguir). Sendo assim, as variáveis de tensão e corrente medidas precisam ser ajustadas ou normalizadas para as mesmas condições especificadas nas folhas de dados. A condição padrão de teste STC (standard test condition), na qual os parâmetros elétricos dos módulos são apresentados nas folhas de dados, corresponde à temperatura da célula de 25 ºC e irradiância de 1000 W/m2. Como a condição STC não é atingida na prática, os fabricantes de vez em quando fornecem uma outra opção para que seja possível ter uma perspectiva diferente a respeito dos parâmetros elétricos dos módulos. A condição NOCT (nominal operating cell temperature) corresponde a uma temperatura ambiente de 20 oC, com irradiância de 800 W/m2 e velocidade do vento de 1 m/s. Devido ao fato de os principais parâmetros dos módulos fotovoltaicos serem dependentes da irradiância e da temperatura de operação das células, é indubitável a necessidade de sensores capazes de medir essas duas variáveis. Neste artigo, será demonstrado um exemplo prático de normalização da tensão de circuito aberto e da corrente de curto-circuito de um módulo fotovoltaico, viabilizando uma comparação eficaz com os dados presentes no datasheet fornecido pelo fabricante.

Experimento realizado em campo

Vamos nos basear em um experimento prático para demonstrar os procedimentos de ajuste da tensão de circuito aberto (VOC) e da corrente de curto-circuito (ISC) de um módulo fotovoltaico, tendo como base de ajuste a temperatura da célula e a irradiância medidas no local. Os seguintes instrumentos foram utilizados neste experimento:

  • Sensores de irradiância e temperatura acoplados a um dispositivo com display;
  • Módulo de 320 Wp de silício policristalino, posicionado em um telhado com inclinação de 5º;
  • Um multímetro convencional.

Com o propósito de aferir as condições climáticas em uma situação mais próxima da condição NOCT, optou-se por realizar os testes em um horário em torno do meio-dia, quando a irradiância e a temperatura ambiente são mais elevadas. A temperatura ambiente no momento dos testes era de 35 ºC. O fato de se fazer o experimento num horário de elevada irradiância também é útil para melhorar a análise da tensão de circuito aberto. A tensão de circuito aberto do módulo fotovoltaico tem uma dependência direta da temperatura e praticamente não sofre influência da irradiância, desde que o nível de irradiância seja elevado. Em outras palavras, o ajuste da tensão de circuito aberto para uma das condições padrão (STC ou NOCT) pode ser feito apenas em função da variável temperatura. Na montagem deste experimento o sensor de temperatura  foi instalado em contato com a região central da parte traseira do módulo (backsheet). O sensor de irradiância foi instalado de forma coplanar à superfície do módulo fotovoltaico, conforme mostra a Figura 1. Por fim, os sensores são conectados aos terminais do display, possibilitando a visualização dos parâmetros durante os testes.

Figura 1: Montagem do experimento

Figura 1: Montagem do experimento

Findada a instalação dos sensores, foram conectadas as pontas de provas do multímetro aos terminais do módulo fotovoltaico em circuito aberto. O registro fotográfico dos resultados coletados em campo é mostrado na Figura 2 a seguir.

Figura 2: Medição simultânea da temperatura de operação da célula, da irradiância solar e da tensão de circuito aberto do módulo fotovoltaico

Figura 2: Medição simultânea da temperatura de operação da célula, da irradiância solar e da tensão de circuito aberto do módulo fotovoltaico

A Figura 3 mostra a corrente de curto-circuito do módulo sendo medida simultaneamente com a temperatura e a irradiância solar. Esta medida deve ser feita cautelosamente, pois o fechamento e a abertura do circuito podem originar um perigoso arco elétrico. A conexão do módulo fotovoltaico em série com o multímetro e o fechamento e a posterior abertura do circuito devem ser feitos com o auxílio de uma chave seccionadora. Os circuitos fotovoltaicos de corrente contínua nunca devem ser seccionados sob carga (ou seja, com a presença de corrente elétrica) sem um dispositivo de seccionamento com a capacidade de extinção do arco elétrico.

Figura 3: Coleta de dados de corrente de curto-circuito, temperatura da célula e irradiância incidente no plano do módulo fotovoltaico

Figura 3: Coleta de dados de corrente de curto-circuito, temperatura da célula e irradiância incidente no plano do módulo fotovoltaico

Características STC e NOCT da folha de dados

Para comparar os resultados medidos com as características especificadas pelo fabricante precisamos buscar os parâmetros elétricos nas tabelas apresentadas na folha de dados. Neste exemplo foi avaliado o módulo 320P6K-36. Os parâmetros que buscamos são a tensão de circuito aberto (VOC) em STC e NOCT e os coeficientes térmicos de corrente e de tensão em relação à temperatura, normalmente expressos em %/oC. A unidade %/oC indica que o coeficiente térmico determina a variação percentual da tensão ou da corrente (em relação ao valor nominal em STC) em função da variação da temperatura. Como se pode verificar na folha de dados, o coeficiente da corrente é positivo e o da tensão é negativo. Um coeficiente negativo indica que o aumento da temperatura causa a redução da tensão de circuito-aberto do módulo fotovoltaico.

Tabela 1: Parâmetros elétricos do módulo fotovoltaico em NOCT

 

Tabela 1: Parâmetros elétricos do módulo fotovoltaico em NOCTTabela 2: Coeficientes térmicos do módulo fotovoltaico

 

Tabela 2: Coeficientes térmicos do módulo fotovoltaicoTabela 3: Características elétricas do módulo fotovoltaico em STC

Tabela 3 Características elétricas do módulo fotovoltaico em STC Das tabelas podemos extrair os seguintes parâmetros do módulo 320P6K-36:

  • Tensão de circuito aberto em STC: VOC,STC = 46,39 V;
  • Tensão de circuito aberto em NOCT: VOC,NOCT = 42,8 V;
  • Corrente de curto-circuito em STC: ISC,STC = 9,15 A;
  • Corrente de curto-circuito em NOCT: ISC,NOCT = 7,42 A;
  • Coeficiente térmico de corrente ISC: Alfa = 0,07 %/oC;
  • Coeficiente térmico da tensão VOC: Beta = -0,31 %/oC.

Ajuste da tensão de circuito aberto

Após medirmos as variáveis de tensão de circuito aberto, temperatura da célula e irradiância solar, nosso objetivo será analisar o valor de tensão e compará-lo com o valor mostrado na folha de dados do módulo. Para que essa comparação seja possível é necessário ajustar o valor em relação à temperatura e à irradiância, para a obtenção de um valor de tensão normalizado na condição STC (25 oC e 1000 W/m2). Alternativamente, podemos também usar como base para nossa análise os parâmetros do módulo em NOCT. Ou seja, podemos optar por avaliar o módulo pela sua condição NOCT informada na folha de dados. Neste caso, vamos ajustar o valor de VOC medido nas condições do experimento à condição NOCT, para depois compararmos o resultado desse ajuste com o valor de VOC,NOCT  (tensão de circuito aberto na condição NOCT) apresentado na folha de dados. No módulo empregado neste experimento encontramos a tensão de circuito aberto VOC,NOCT = 42,8V e o coeficiente térmico Beta igual a -0,31%/ºC, que expressa a variação da tensão de circuito aberto em função da temperatura. Vamos mostrar como é feito o ajuste da tensão de circuito aberto medida. Com este procedimento poderemos comparar a tensão medida com a tensão apresentada na folha de dados do fabricante.

Ajuste da tensão de circuito aberto para a condição NOCT

De acordo com o datasheet do fabricante, a temperatura de operação da célula nas condições de NOCT é de 45 ± 2 ºC. Portanto, devemos tomar este valor como referência para ajustar os nossos dados. Segundo o sensor de temperatura, temos uma temperatura de 61,3 ºC no experimento, um valor 16,3 ºC acima do padrão NOCT. A diferença de temperatura deve ser multiplicada pelo coeficiente Beta, resultando um fator de correção que expressa a variação percentual da tensão de circuito aberto em relação ao valor NOCT. A tensão de circuito aberto normalizada é obtida da seguinte forma:

DT = TEXPERIMENTAL – TNOCT

fc = Beta x DT

VOC,AJUSTADA = VOC,EXPERIMENTAL – fc * VOC,NOCT

Onde:

  • DT = intervalo de temperatura entre o valor experimental e o valor de referência (NOCT) [ºC];
  • fc = fator de correção calculado no intervalo de temperatura;
  • Beta = coeficiente térmico da tensão [%/ºC];
  • VOC,EXPERIMENTAL = VOC medida na temperatura experimental [V];
  • VOC,NOCT = VOC medida na temperatura de referência [V];
  • VOC,AJUSTADA = VOC ajustada para a condição NOCT [V].

Exemplo numérico, com base no experimento realizado:

DT = 61,3 ºC – 45 ºC = 16,3 ºC

fc = -0,31 x 16,3 = -5,053 %/ºC

fc * VOC,NOCT = -5,053/100 x 42,8 V = -2,16 V

VOC,AJUSTADA = 40,19 V – (-2,16 V) = 42,35 V

Comparando numericamente os valores da tensão VOC,AJUSTADA (42,35 V) com a tensão VOC,NOCT do catálogo (42,8 V), verificamos uma proximidade grande dos valores. Isso permite constatar que o módulo fotovoltaico, do ponto de vista da tensão de circuito aberto, encontra-se íntegro. Este procedimento de medição e ajuste pela temperatura torna-se tão mais importante quanto maior o número de módulos ligados em série. O profissional, ao fazer a medição da tensão de uma string com numerosos módulos, não tem a certeza de medir o valor correto exceto pelo ajuste da variável medida em relação a uma condição de referência (STC ou NOCT), para que o valor medido possa ser comparado com os valores encontrados na folha de dados do produto.

Ajuste da corrente de curto-circuito para a condição STC

O processo de tratamento da corrente de curto-circuito (ISC) segue uma metodologia diferente. Neste caso o ajuste da variável medida é feito com base em duas variáveis: temperatura e irradiância. No caso anterior, desprezamos o efeito da irradiância, pois para um valor de irradiância elevado o efeito dela sobre a tensão de circuito aberto é desprezível, sendo que essa variável depende diretamente da temperatura. No caso da corrente de curto-circuito, por outro lado, a principal variável de influência é a irradiância, juntamente com um efeito menor da temperatura. Para os nossos cálculos, devemos empregar o coeficiente térmico Alfa da corrente de curto-circuito, que também pode ser encontrado na folha de dados. Temos a seguinte equação para ajustar os dados coletados em condições experimentais para a condição STC [1]:

ISC,AJUSTADA = ISC,EXPERIMENTAL * [ 1 – Alfa x (TSTC – TEXPERIMENTAL) ] * IrradSTC/IrradEXPERIMENTAL

Onde:

  • ISC,AJUSTADA = corrente ajustada para a condição STC [A];
  • ISC,EXPERIMENTAL = corrente medida experimentalmente [A];
  • Alfa = coeficiente térmico da corrente de curto-circuito [%/oC];
  • TSTC = temperatura STC (25 oC);
  • TEXPERIMENTAL = temperatura experimental [oC];
  • IrradSTC = irradiância em STC (1000 W/m2);
  • IrradEXPERIMENTAL = irradiância experimental [W/m2].

Numericamente, temos:

ISC,AJUSTADA = 8,089 * [ 1 – 0,07/100 x (61,7 – 25) ] * 1000/903 = 9,19 A

Comparando numericamente os valores de ISC,AJUSTADA (9,19 A) com o valor em STC obtido no catálogo (9,15 A), o teste apresentou um erro de 0,04% em relação ao dado fornecido pelo fabricante. Os valores são muito próximos, mostrando que o módulo testado apresenta corrente de curto-circuito compatível com a especificação do fabricante.

Conclusão

Os ensaios de comissionamento fotovoltaico são fundamentais para validar o correto funcionamento de um sistema. A norma NBR 116274:2014 descreve várias categorias de testes. Os testes de tensão de circuito aberto e de corrente de curto-circuito fazem parte da categoria 1, que são os requisitos mínimos da norma. Para a correta avaliação de um módulo fotovoltaico – ou de uma string de módulos – é preciso realizar o ajuste dos valores de tensão e corrente medidos em função da temperatura e da irradiância solar, que precisam ser medidas simultaneamente. Neste artigo mostramos como realizar o ajuste da tensão de circuito aberto para a temperatura NOCT e da corrente de curto-circuito para a condição STC. Nos dois casos, os resultados obtidos experimentalmente mostraram-se muito próximos dos valores obtidos na folha de dados do fabricante do módulo.

Referências

  • [1] Roy, J., Bliss, M., Betts, T. R., & Gottschalg, R. (2010). Effect of I-V translations of irradiance-temperature on the energy yield prediction of PV module and spectral changes over irradiance and temperature. Proceedings of the 6th Photovoltaic Science Applications and Technology Conference (PVSAT-6), 149–152. https://dspace.lboro.ac.uk/
  • [2] ABNT NBR 16274:2014 – Sistemas fotovoltaicos conectados à rede – Requisitos mínimos para documentação, ensaios de comissionamento, inspeção e avaliação de desempenho

 

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Elson Yoiti Sakô

Elson Yoiti Sakô

Graduado em Engenharia Elétrica (UNICAMP). Mestrando em Engenharia Elétrica com ênfase em Sistemas Fotovoltaicos (UNICAMP)

Um comentário

  • Leonel Poltosi disse:

    Prezado Elson muito obrigado por compartilhar estas informações. O método que você proponhe para ser aplicado no comissionamento é bastante pratico de ser operacionalizado. Para ficar perfeito, sugiro você revisar a ultima equação: ISC AJUSTADA. As temperaturas T_EXPERIMENTAL e T_STC estão em posições trocadas na equação. O resultado esta correto, porém na equação – provável erro ao editar – estão em posições trocadas. Grato

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