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Filmes finos CIGS: uma alternativa ao silício cristalino

O processo de fabricação dos filmes finos é diametralmente oposto ao dos semicondutores cristalinos

Autor: 30 de maio de 2020outubro 28th, 2020Artigos técnicos
11 minutos de leitura
Filmes finos CIGS: uma alternativa ao silício cristalino

No mercado de energia solar fotovoltaica existem basicamente duas famílias de tecnologias: a do silício cristalino e a dos filmes finos.

A tecnologia cristalina, à qual pertencem os silícios mono e policristalino, é responsável pela maior fatia de mercado e responde pela quase totalidade das células e dos módulos fotovoltaicos fabricados no mundo.

Por outro lado, há um interessante nicho de mercado para a tecnologia denominada filmes finos. O processo de fabricação dos filmes finos é diametralmente oposto ao dos semicondutores cristalinos.

Enquanto na tecnologia cristalina as células são fabricadas a partir da serragem de lingotes sólidos de silício, as células e os módulos de filmes finos são fabricados a partir da deposição de pequenas partículas de semicondutores sobre superfícies que podem ser rígidas ou flexíveis.

A técnica de deposição de filmes finos é empregada em muitas áreas da indústria e é um importante campo de estudo da ciência dos materiais.

A deposição de um filme fino é o ato de aplicar uma fina camada de um material à superfície de outro material, modificando as características físicas ou químicas do material receptor.

O processo de deposição de um filme fino pode ser realizado por vários métodos, dentre os quais um dos mais utilizados é a deposição física de vapor (PVD – physical vapor deposition).

A técnica PVD corresponde à deposição de um material sobre uma superfície através de sua vaporização dentro de uma câmara de vácuo aquecida.

O material a ser depositado é vaporizado pela aplicação de uma alta temperatura. A deposição pode ocorrer através de um processo puramente físico ou pode envolver reações químicas na superfície do substrato (material que recebe o filme fino).

O resultado da deposição física de vapor é a produção de uma fina película, conhecida mais comumente como filme fino, do material que foi vaporizado.

A velocidade da vaporização pode ser controlada, permitindo o ajuste da espessura da camada. É possível também submeter o substrato a diversas etapas de deposição, acrescentando gradualmente diversas camadas do mesmo material ou de materiais diferentes.

Vantagens da técnica de deposição de filmes finos

A fabricação de filmes finos pelo processo de deposição a vapor emprega quantidades controladas de materiais, evitando desperdícios, e é energeticamente mais eficiente do que a fabricação do silício cristalino.

Na fabricação de lingotes cristalinos, mono ou poli, são necessárias elevadas temperaturas para a fusão do silício, o que demanda grandes quantidades de energia.

O processo depois requer a serragem do silício para a fabricação de wafers, processo no qual ocorrem perdas. Além de tudo, a fabricação de filmes finos é mais rápida e requer menos etapas do que a fabricação de células cristalinas.

O mito da baixa eficiência dos filmes finos

Os dispositivos fotovoltaicos de filmes finos ocupam uma fatia muito pequena do mercado de geração de energia, mas os benefícios e as promessas que envolvem essa tecnologia estimulam muitos esforços na pesquisa e no desenvolvimento de células e módulos fotovoltaicos de filmes finos.

Uma conhecida desvantagem da célula fotovoltaica de filme fino é sua reduzida eficiência em comparação com o silício cristalino.

Isso é verdade se tratando de filmes finos de silício amorfo ou mesmo de silício microcristalino, que exigem a produção de células de duas ou mais junções (cujo processo de fabricação é mais custoso) para a obtenção de células que possam competir em eficiência com o silício cristalino.

Diversos centros de pesquisas e fabricantes em todo o mundo vêm buscando novos materiais para a fabricação de filmes finos com uma boa relação de custo e benefício.

Destacam-se entre esses materiais o telureto de cádmio (CdTe) e a liga de cobre-índio-gálio-selênio (CIGS), que permitem a fabricação de células e módulos fotovoltaicos com eficiências que alcançam (e podem até mesmo ultrapassar) as marcas obtidas pelos dispositivos de silício cristalino.

Células fotovoltaicas CIGS

O CIGS (cobre-índio-gálio-selênio) é um dos principais materiais atualmente empregados na fabricação de células fotovoltaicas de filmes finos.

O CIGS tem um bom coeficiente de absorção da luz solar, permitindo o uso de camadas mais finas do que as que seriam necessárias com outros tipos de semicondutores.

Células CIGS já foram fabricadas em laboratórios com eficiências superiores a 21% e comercialmente os módulos têm eficiências variando entre aproximadamente 15% e 18%, muito próximas das eficiências dos módulos de silício cristalino.

CIGS é uma das únicas tecnologias de materiais, ao lado do CdTE, que conseguem competir comercialmente com o silício cristalino.

Enquanto o grande mercado de geração de energia emprega massivamente o silício cristalino, há diversas aplicações em que as células CIGS destacam-se.

Os filmes CIGS podem ser depositados sobre superfícies plásticas ou de vidro, permitindo a criação de uma variedade de produtos fotovoltaicos, como módulos flexíveis e telhas com diversos formatos.

Figura 1: Fotografia microscópica de uma célula CIGS típica. Acima do substrato de vidro é aplicada uma fina camada de molibdênio, acima da qual é aplicada a camada principal de CIGS (semicondutor P) de 1 micrômetro. Após uma camada semicondutora N, bem fina, é aplicada uma camada final condutiva e transparente de óxido de zinco com alumínio, responsável pelos contatos frontais da célula. Fonte: TU Delft

Figura 1: Fotografia microscópica de uma célula CIGS típica. Acima do substrato de vidro é aplicada uma fina camada de molibdênio, acima da qual é aplicada a camada principal de CIGS (semicondutor P) de 1 micrômetro. Após uma camada semicondutora N, bem fina, é aplicada uma camada final condutiva e transparente de óxido de zinco com alumínio, responsável pelos contatos frontais da célula. Fonte: TU Delft

Figura 2: Estrutura de uma célula de silício cristalino: contato traseiro, silício do tipo P, silício do tipo N, camada reflexiva e contatos metálicos frontais

Figura 2: Estrutura de uma célula de silício cristalino: contato traseiro, silício do tipo P, silício do tipo N, camada reflexiva e contatos metálicos frontais

Figura 3: Estrutura de uma célula de filme fino CIGS: vidro, contato traseiro de molibdênio, CIGS (semicondutor P), sulfeto de cádmio (material N) e óxido de zinco (condutor transparente para os contatos frontais)

Figura 3: Estrutura de uma célula de filme fino CIGS: vidro, contato traseiro de molibdênio, CIGS (semicondutor P), sulfeto de cádmio (material N) e óxido de zinco (condutor transparente para os contatos frontais)

Apesar de todas a vantagens apresentadas, existe um grande problema na escalabilidade da produção de células e módulos CIGS: o elemento “I”, o índio, é um dos materiais mais raros do planeta.

O gráfico abaixo, nos dá uma dimensão de quão difícil é encontrar índio na natureza. Entretanto, o índio é empregado também na fabricação de componentes eletrônicos e displays, então sua disponibilidade comercial não é desprezível.

Figura 4: Abundância de átomos de diferentes elementos químicos na natureza. A escala vertical do gráfico mostra o número de átomos de cada elemento para cada 1 milhão de átomos de silício. Existe menos de 1 átomo de índio disponível no planeta para cada 1 milhão de átomos de silício. Fonte: TU Delft

Figura 4: Abundância de átomos de diferentes elementos químicos na natureza. A escala vertical do gráfico mostra o número de átomos de cada elemento para cada 1 milhão de átomos de silício. Existe menos de 1 átomo de índio disponível no planeta para cada 1 milhão de átomos de silício. Fonte: TU Delft

Figura 5: Módulos de filmes finos CIGS rígidos com células depositadas sobre vidro. Podem ser usados em fachadas e são bons absorvedores de luz difusa, além de possuírem um reduzido coeficiente térmico, o que os torna adequados para a aplicação em locais quentes. Fonte: NICE Solar Energy, Alemanha (divulgação)

Figura 5: Módulos de filmes finos CIGS rígidos com células depositadas sobre vidro. Podem ser usados em fachadas e são bons absorvedores de luz difusa, além de possuírem um reduzido coeficiente térmico, o que os torna adequados para a aplicação em locais quentes. Fonte: NICE Solar Energy, Alemanha

Por que CIGS?

Quando o objetivo é produzir células e módulos fotovoltaicos flexíveis ou que tenham formatos não planos, a única opção possível é o uso de filmes finos.

As células de silício cristalino necessariamente são planas, rígidas e muito quebradiças, necessitando de estruturas robustas e pesadas, com vidro e moldura de alumínio, para seu acondicionamento.

Módulos fotovoltaicos flexíveis, telhas, toldos, coberturas de veículos e elementos decorativos para fachadas de prédios podem ser produzidos a partir de filmes finos. Silício cristalino não é uma opção nesses casos.

Dentre as opções de materiais para a produção e dispositivos fotovoltaicos de filmes finos, CIGS é uma das melhores alternativas, como já foi comentado na seção anterior.

A tabela abaixo, mostra um comparativo de eficiência de módulos fotovoltaicos produzidos com as principais tecnologias comercialmente disponíveis.

Para melhor comparação, a tabela a seguir refere-se somente à eficiência de módulos fotovoltaicos rígidos com vidro.

Embora filmes finos sempre sejam apontados como uma alternativa para módulos fotovoltaicos não convencionais, a tecnologia CIGS compete também no mercado de módulos fotovoltaicos rígidos.

Tabela 1: Eficiências de módulos FV com diferentes tecnologias. Fonte: Curso de Introdução à Energia Solar Fotovoltaica (UNICAMP)Tabela 1: Eficiências de módulos FV com diferentes tecnologias. Fonte: Curso de Introdução à Energia Solar Fotovoltaica (UNICAMP)

Algumas vantagens dos módulos CIGS

  • Produção sustentável, com o uso de menos recursos energéticos e menor volume de matéria prima. Uma célula CIGS é 100 vezes menos espessa do que uma célula cristalina de silício;
  • Coeficiente térmico reduzido. Esta é uma vantagem encontrada em todos os filmes finos, que sofrem menos com a elevação da temperatura;
  • Módulos de filmes finos são bons absorvedores de luz difusa, sendo adequados para a instalação em posição vertical, o que permite sua integração à arquitetura. Podem ser usados como revestimento em fachadas de prédios e instalados em locais que tipicamente não são adequados para o emprego de módulos cristalinos;
  • Podem ser fabricados em dimensões pequenas ou grandes, sem as restrições de tamanho conhecidas nos módulos cristalinos devido à fragilidade das células;
  • Não sofrem com o problema de microcracks como os módulos cristalinos;
  • Módulos CIGS chegam perto da eficiência de módulos cristalinos comerciais, com as vantagens dos filmes finos.
Figura 6: Módulos de filme CIGS podem ser usados como revestimento arquitetônico. Fonte: Photovoltaic Systems for Facades and Roofs, NICE Solar Energy

Figura 6: Módulos de filme CIGS podem ser usados como revestimento arquitetônico. Fonte: Photovoltaic Systems for Facades and Roofs, NICE Solar Energy

Tabela 2: Características mecânicas e elétricas de um módulo CIGS comercial com eficiência de aproximadamente 14,58% (calculada a partir das especificações). Fonte: NICE Solar Energy, Alemanha

Tabela 2: Características mecânicas e elétricas de um módulo CIGS comercial com eficiência de aproximadamente 14,58% (calculada a partir das especificações). Fonte: NICE Solar Energy, Alemanha

Telhas fotovoltaicas CIGS

Telhas fotovoltaicas são algumas das inúmeras possibilidades de aplicação dos filmes finos CIGS. Além de permitir a fabricação de telhas em diferentes formatos (curvados, planos, ondulados), a tecnologia CIGS é muito superior à cristalina neste tipo particular de aplicação.

Já houve tentativas de produção de telhas fotovoltaicas na indústria com o uso de células cristalinas de silício, mas os resultados dessas tentativas são apenas telhas com células fotovoltaicas em cima – e não telhas genuinamente fotovoltaicas.

Além de não permitirem a cobertura da área total da telha com material fotovoltaico e limitarem bastante os formatos e as dimensões de telhas possíveis, células cristalinas não são convenientes para esse tipo de aplicação em função de sua fragilidade, de seu elevado coeficiente térmico e de sua vulnerabilidade a sombras.

As células de filmes finos são fabricadas com larguras muito pequenas, o que torna fácil a produção de telhas com tensões de várias dezenas até uma centena de volts.

Por outro lado, telhas fotovoltaicas com células cristalinas vão naturalmente apresentar baixas tensões de saída (devido ao pequeno número de células empregadas), o que torna necessário a ligação de um grande número de telhas em série nas aplicações práticas.

Telhas fotovoltaicas com células cristalinas ainda sofrem de outros problemas como a sujeição das células a microfissuras, o baixo número de células por telha (que torna o produto pouco eficiente) e a impossibilidade de cobrir toda a área do telhado com material fotovoltaico (o que também tem como resultado a baixa eficiência do sistema.

Por último, um problema muitas vezes desprezado pelos fabricantes de telhas fotovoltaicas: o formato da telha causa sombra na sua própria célula, o que reduz substancialmente a eficiência em aplicações práticas – não bastassem todos os outros problemas encontrados nesse tipo de produto.

Figura 7: À esquerda: telhas convencionais com células fotovoltaicas coladas em sua superfície superior. À direita: telhas fotovoltaicas genuínas, construídas à base de filmes finos

Figura 7: À esquerda: telhas convencionais com células fotovoltaicas coladas em sua superfície superior. À direita: telhas fotovoltaicas genuínas, construídas à base de filmes finos

Telhas fotovoltaicas construídas à base de filmes CIGS são uma excelente solução dos pontos de vista técnico e estético.

Além de sua aparência uniforme, os filmes CIGS possibilitam elevada eficiência e permitem que toda a área do telhado seja coberta por material fotovoltaico, maximizando o aproveitamento da área disponível para a instalação.

Figura 8: Telha fotovoltaica de filme CIGS. Fonte: Hantile / L8 Energy

Figura 8: Telha fotovoltaica de filme CIGS. Fonte: Hantile / L8 Energy


Marcelo Villalva

Marcelo Villalva

Especialista em sistemas fotovoltaicos. Docente e pesquisador da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da UNICAMP. Coordenador do LESF - Laboratório de Energia e Sistemas Fotovoltaicos da UNICAMP. Autor do livro "Energia Solar Fotovoltaica - Conceitos e Aplicações".

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