Muito se tem falado no ambiente do setor elétrico, entre parlamentares e na imprensa a respeito de emendas supostamente alheias ao texto do Projeto de Lei nº 576/2021, que estabelece um marco regulatório para a geração de energia eólica offshore.
Em particular, as críticas recaem sobre os custos que podem incorrer ao consumidor final e contradições em relação à economia de baixo carbono.
Têm nos causado surpresa, em muitas das manifestações, a falta de menções diretas ao artigo 23 do PL das Eólicas Offshore, que no entendimento de parte considerável de especialistas do setor elétrico e da sustentabilidade, traz contribuições para a geração de energia limpa, indo ao encontro dos objetivos do marco regulatório em questão.
O artigo 23 tem importância estratégica para o setor elétrico brasileiro e traz impactos positivos em várias dimensões, à medida em que propõe a extensão do prazo para conexão de usinas solares de micro e minigeração distribuída (MMGD) de 12 para 24 meses a partir da assinatura do Contrato de Uso do Sistema de Distribuição (CUSD).
Esta medida somente corrige uma incoerência no sistema regulatório, ao passo que beneficia diretamente a transição energética do Brasil, conforme apresentado a seguir:
- Segurança jurídica e confiança dos investidores: A alteração do marco regulatório da contagem de prazo do Orçamento de Conexão para o CUSD promove maior segurança jurídica, permitindo aos empreendedores uma previsibilidade essencial para a conclusão dos projetos. Isto reforça a confiança dos investidores, especialmente em um mercado que já enfrenta desafios significativos de infraestrutura e burocracia.
- Inexistência de novos custos: A ampliação do prazo não gera custos adicionais para os consumidores ou para as políticas públicas de incentivo à geração distribuída. O texto não abre espaço para novos projetos sob as mesmas regras, mas apenas possibilita que os empreendimentos existentes tenham tempo suficiente para superar os atrasos causados por terceiros.
- Preservação de investimentos e geração de empregos: O veto ao artigo pode levar à perda de 8,6 GW de capacidade em projetos já aprovados, comprometendo R$ 36 bilhões em investimentos e milhares de empregos. A garantia deste prazo adicional assegura que tais recursos permaneçam no Brasil, incentivando o desenvolvimento econômico e a sustentabilidade.
Justificativas vão além do caráter de incentivo
A implementação de projetos de MMGD enfrenta entraves que estão além do controle dos empreendedores, muitas vezes desconhecidos pela imprensa e parlamentares, por isso a necessidade de se estender o prazo para conexão dos projetos em andamento:
- As distribuidoras de energia ainda estão se adaptando à MMGD: Como se trata de uma modalidade de geração recente, as distribuidoras ainda estão adaptando seus sistemas e procedimentos para este atendimento, motivo pelo qual os prazos regulados para emissão de documentos e vistorias acabam sendo descumpridos, causando atrasos que podem comprometer a viabilidade dos projetos.
- Demoras nos órgãos ambientais: O licenciamento ambiental muitas vezes se estende além do previsto, prejudicando o cronograma dos empreendimentos.
- Falta de infraestrutura e coordenação: A dificuldade de viabilizar investimentos por parte das distribuidoras de energia e a complexidade de processos burocráticos também contribuem para a lentidão na conclusão dos projetos.
Redução da judicialização e benefícios sociais
A manutenção do artigo 23 tem o potencial de reduzir a judicialização no setor elétrico, uma vez que corrige um desequilíbrio estrutural que frequentemente resulta em litígios.
Ademais, ao permitir que projetos sejam concluídos, o artigo assegura benefícios diretos para “prossumidores” (consumidores convencionais que produzem a própria energia), pequenos produtores rurais e empreendedores locais, além de fomentar a diversificação da matriz energética brasileira com energia limpa e renovável.
Geração perto da carga
Uma justificativa adicional é que a geração por MMGD se dá próxima aos consumidores, apresentando benefícios para o sistema elétrico como:
- (i) redução das perdas técnicas na distribuição;
- (ii) postergação ou até eliminação de investimentos nas redes de distribuição e transmissão; e,
- (iii) minimização dos efeitos das mudanças climáticas que ameaçam as infraestruturas de transporte de energia.
No futuro, vai existir a necessidade de adaptação a esta nova forma de gerar energia através de um controle maior das redes, mas somente quando o nível de penetração da MMGD aumentar significativamente, o que não é o caso da extensão prevista no artigo em questão.
A importância da sanção ao artigo 23
O artigo 23 é uma medida que promove justiça regulatória, preserva investimentos já realizados e incentiva o avanço da Geração Distribuída no Brasil. Seu veto comprometeria não apenas o desenvolvimento do setor, mas também a transição para uma matriz energética mais limpa e inclusiva.
Nesse contexto, é importante que o Executivo, ao sancionar o PL 576/2021, garanta a manutenção do artigo 23, reafirmando o compromisso do Brasil com a sustentabilidade, a segurança energética e a promoção de uma economia de baixo carbono.
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