O mercado solar fotovoltaico tem crescido de maneira exponencial nos últimos anos não só no Brasil, mas a nível mundial.
Como em qualquer mercado em ascensão deste patamar, sempre há novas empresas sendo criadas de maneira a “surfar a onda” de crescimento – não que isto seja ruim num primeiro momento, pois a concorrência em qualquer mercado é sadia – porém o problema se inicia quando essa competição não é saudável como espera-se.
Especificamente sobre o nosso mercado, isto ocorre em toda a cadeia com o surgimento de empresas integradoras, distribuidores e claro, fabricantes de equipamentos.
No meio disto tudo está o cliente final – na maior parte das vezes com boa intenção, de comprar equipamentos de qualidade e confiabilidade – mas que desconhece a tecnologia, a robustez do fabricante por trás dos equipamentos, a solidez da empresa integradora que está realizando a venda e instalação, entre outros.
Isto porque, nas propostas que este cliente recebeu, no papel todos geram a mesma energia/economia, portanto pareceria simples escolher a mais vantajosa economicamente – leia-se proposta mais barata.
Obviamente nós (sim, eu e você, empresa séria no mercado, que está lendo isto) sabemos que isso não é verdade e que, por mais que uma proposta diga gerar a mesma energia, diversos fatores impactarão na real economia do cliente final.
O objetivo deste artigo é apresentar alguns pontos fundamentais e que precisam ser claramente demonstrados aos nossos clientes, pra que entendam o valor agregado que está vinculado a proposta que ele está recebendo, que os equipamentos não são “todos iguais” e que, num investimento financeiro de longo prazo (> 25 anos), espera-se que as empresas estejam aqui para atender as solicitações e garantias que eventualmente possam ser necessárias, pois de nada adianta existir um termo em um papel dizendo que o módulo X tem 25 anos de garantia, se daqui 5 anos esse fabricante sequer existirá para atendê-la.
Então, como eu posso escolher um módulo FV de maneira segura, pensando em confiança ao longo do tempo?
Pra isso, diferentemente de analisar um datasheet, olhar a potência, dados técnicos e compatibilidade, iremos apresentar algumas classificações (técnicas e financeiras) que auxiliarão o cliente na decisão.
E pra isso iniciaremos explicando a mais conhecida dentro do mercado fotovoltaico – Lista Bloomberg Tier1.
Durante um período, ela foi utilizada de forma ampla e, de certo modo erroneamente, como um atestado de qualidade do módulo fotovoltaico, sendo que a própria Bloomberg não recomenda que os investidores utilizem a lista fornecida por eles como um atestado de qualidade técnica.
Este estudo traz, na verdade, um parecer financeiro sobre a empresa analisada, cujos produtos são fabricados diretamente pela empresa e que foram utilizados em no mínimo 6 grandes projetos financiados por bancos internacionais.
Porém, ela por si só não me traz segurança de que um fabricante, APENAS por ser listado como Tier1, pode ser escolhido sem ressalvas – Veja a lista abaixo com 47 empresas nessa lista.
Um ponto importante a ser analisado nessa lista é a segunda coluna onde, além de destacar o fabricante classificado como Tier1, mostra sua capacidade produtiva anual – Veja que temos fabricantes como Longi (95GW/ano), Trina (75GW/ano) e JA Solar (65GW/ano) numa mesma lista de fabricantes com 210MW/ano – 0,2% da capacidade anual da Longi por exemplo.
O segundo órgão que apresentaremos é o PVEL – PV Evolution Labs – que é um laboratório situado na Califórnia que realiza estudos e pesquisas a respeito de tecnologias e sua confiabilidade e que realiza, anualmente desde 2014, diversos testes de resistência nos produtos – buscando averiguar não só as informações do datasheet mas, principalmente, o comportamento destes módulos em condições reais de funcionamento ao longo do tempo (degradações aceleradas em laboratório). Entre os testes realizados, estão:
- Thermal Cycling (TC600): Este teste avalia a capacidade do módulo fotovoltaico a suportar mudanças amplas de temperatura, contraindo e expandindo sem que haja danos além do esperado para manter sua performance;
- Damp Heat Test: Ele simula a degradação e falha de longo prazo que são típicos em altas temperaturas e condições de alta umidade, onde isto pode enfraquecer os materiais que unem o módulo fotovoltaico;
- Mechanical Stress Sequence: Avalia se o módulo sofrerá microfissuras sobre pressão mecânica e se perde além disto, perderá rendimento/energia.
- PID: Degradação induzida de potencial;
- LID e LeTID: A degradação induzida por luz (LID) e a degradação induzida por luz e temperatura elevada (LETID) são fenômenos baseados em células desencadeados pela exposição à luz que são frequentemente incorporados em modelos de produção de energia;
- PAN Performance: Avalia a confiabilidade e segurança do arquivo PAN (utilizado para simulações de geração no software PVSyst) com relação às condições reais, ou seja, com as variações de parametros que ocorrerão – pois a simulação pvsyst é utilizada em investimentos para atestar a confiabilidade de que aquela energia será produzida. No mercado brasileiro, temos problemas com arquivos PAN de má qualidade ou confiança, produzindo dados de rendimento que não ocorrerão na prática, onerando o investidor;
- Backsheet Durability Sequence: Avalia os riscos de danos ao backsheet do módulo fotovoltaico, que pode prejudicar sua eficiência ao longo da sua vida útil;
- Hail Stress Sequence: Análise do impacto de granizo sobre os módulos.
Ao final destes testes, a PVEL divulga uma lista dos produtos/fabricantes que foram aprovados nestes testes e que representam uma qualidade esperada de suportabilidade destes produtos as condições reais e limites de operação – este sim é um relatório que podemos nos embasar para considerar a qualidade do módulo fotovoltaico, salientando que ele isoladamente também não representa um atestado 100% de confiabilidade do fabricante – mas é um bom indício.
Mais importante do que analisar quem está no último relatório, é fundamental perceber os fabricantes que, ano após ano, permanecem sempre sendo aprovados nestes testes – com módulo poli, mono, perc, bifacial, etc.
Seja qual for a tecnologia aplicada, são confiáveis. Num investimento de longo prazo, é justamente disto que precisamos.
Outro reconhecido laboratório de estudo e testes em módulos fotovoltaicos é o RETC – Renewable Energy Test Center (lider em produtos FV e baterias), recomendado pela Bloomberg como qualidade, cujo objetivo é realizar diversos testes em conjunto com as IEC’s designadas para módulos fotovoltaicos e atestar – teste a teste separadamente – quais fabricantes foram validados no quesito.
Ao final, também divulgam os Top Performers do ano em questão, que são os fabricantes qualificados em grande parte ou até todos os procedimentos realizados. Como exemplos de testes, podemos citar:
Confiabilidade Desempenho e qualidade
- Thresher Test – BOM – São testados os componentes do módulo fotovoltaico
- LeTID Resistence
- Pan File Performance
- Damp Heat Test
- Dynamic Mechanical Load Test
- Thermal Cycle Test
E como citado, ao final, divulgam os Overhall High Achievement Manufacturing – ou seja, um processo de fabricação de excelência.
O que podemos verificar com as informações acima?
Que há alguns fabricantes que se repetem em praticamente todos os testes realizados, trazendo mais uma informação da qualidade técnica dos produtos fornecidos por estes – para os não citados, há duas opções: ou não foram aprovados, ou então seus módulos não foram enviados para análise de um laboratório terceiro, independente.
Como último ponto a ser citado neste artigo como um aspecto de confiabilidade quando falamos de módulos FV, trazemos o órgão PVTech, instituição que divulga trimestralmente desde 2015 as principais métricas financeiras e de fabricação dos principais players de módulos FV do mercado, possibilitando entender, classificar e comparar o status de bancabilidade dos mesmos.
Ou seja, assim como a Bloomberg Tier1, avalia a robustez e confiabilidade financeira desses fornecedores, os classificando em índices dentro de uma pirâmide financeira – similar a utilizada no mercado financeiro por exemplo, pra classificar riscos de investimentos, entre outros.
Nela, quanto mais acima na pirâmide (mais próximo do AAA – nível máximo), mais segura e confiável financeiramente essa empresa é.
Filtrando pro primeiro relatório – Bloomberg Tier1, vemos que apenas 47 destas, em torno de 20% são classificadas desta forma. Porém, destas 47, apenas 25 também possuem classificação certificada pela PVEL, segundo órgão que trouxemos no artigo.
Pirâmide de confiabilidade
Como podemos verificar nas informações citadas ao longo do artigo, há diversas formas de se avaliar a qualidade e principalmente a robustez financeira de uma empresa. Porém, individualmente, não nos traz um dado tão seguro pois, em cada lista, há empresas que não estão citadas nas demais, por diversos motivos.
Com isto, o ideal é cruzar a informação de todos estes institutos e buscar empresas que estejam classificadas em todos eles já que, se diferentes órgãos independentes atestam a qualidade e robustez de um fornecedor, é natural concluir que há um nível maior de confiabilidade desta empresa.
A fabricante JA Solar elaborou uma “pirâmide de confiabilidade” de um fornecedor de módulos fotovoltaicos usando esses 4 institutos que citamos ao longo do texto. O que podemos ver é que, hoje no mercado, existem em torno de 150-200 fabricantes de módulos FV.
Seguindo, ao se realizar um filtro ainda mais criterioso, vemos que destes 25 fabricantes apenas 6 foram certificados como Tops Performers no último ano (2022) da RETC – somente 15% dos fornecedores da lista Tier1 ou menos de 3% do total de fabricantes.
Por fim, se olharmos quais destes 6 também são classificados no mais alto nível de segurança financeira pela PVTech, chegamos a apenas 4 listados como AAA – menos de 2% do total existente.
Sabemos que comparar módulos FV de diferentes fabricantes apenas utilizando seus dados técnicos contidos no datasheet se tornou complicado, pois as informações existentes no mesmo são similares na grande maioria dos casos.
Mas como podemos ver acima, é injusto (e principalmente impreciso) comparar um fabricante como JA Solar, Trina Solar e Longi Solar – 3 dos 4 citados anteriormente, com qualquer fabricante XYZ presente no mercado e que não possui toda essa segurança – seja técnica ou financeira.
Não são o mesmo produto, não possuem a mesma confiabilidade. Uma forma de se comprovar isto ocorreu com alguns relatórios de flash test que circularam em grupos de WhatsApp recentemente (fonte desconhecida) onde diversos módulos vendidos normalmente no nosso mercado, foram testados em laboratórios de credibilidade no Brasil e apresentaram potência bem abaixo da contida em datasheet – prejuízo incalculável para a geração de energia dos clientes.
Lembrem-se: Estamos falando de um produto que possui garantia de 25 anos (ou 30) e que, de forma geral, possui vida útil superior a isto. Qual a segurança sua e de seu cliente de que essa empresa existirá daqui 3, 5, 15 anos, pra atender a garantia proposta por ele? Há alguns fabricantes que estavam no nosso mercado em 2015-2018 que já não existem.
Pra quem esses clientes solicitarão a garantia já que sequer tinham CNPJ no Brasil na época? Em muitos casos irão judicializar e existe a possibilidade do integrador ser corresponsabilizado por isto. Vale o risco? Acredito que não.
Referências
https://canalsolar.com.br/tier-1-qualidade-do-modulo/
https://marketresearch.solarmedia.co.uk/reports/pv-moduletech-bankability-ratings-quarterly-report/
https://www.youtube.com/channel/UCzabN83X42ygXnxTmspx7xw
As opiniões e informações expressas são de exclusiva responsabilidade do autor e não obrigatoriamente representam a posição oficial do Canal Solar.
2 respostas
Esclarecedora essa nota .
Thiago meu amigo excelente texto de grande importância. Obrigado