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Geradores e consumidores entram em divergências sobre perdão da Aneel

Empreendedores apoiam a solução da agência reguladora, enquanto o segmento de consumo teme a imposição de mais custos

Autor: 31 de maio de 2023fevereiro 20th, 2024Artigos, Setor Elétrico
9 minutos de leitura
Geradores e consumidores entram em divergências sobre perdão da Aneel

Proposta da agência é conseguir uma rescisão amigável dos CUST. Foto: Aneel/Reprodução

Os agentes do setor elétrico, em geral, concordaram com a proposta da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) de aliviar as penalidades para os geradores que solicitaram pedidos de outorga para garantir o benefício do uso do fio.

Quem não gostou nada da proposta foram as associações e conselhos representantes dos consumidores de energia elétrica.

Em 22 de maio encerrou o prazo para o envio de contribuições para a Consulta Pública nº 15/2023, que busca adotar mecanismo excepcional para rescisão dos CUST (Contratos de Uso do Sistema de Transmissão) celebrados por centrais geradoras e revogação de outorga, de geradores que demonstram inviabilidade para implementação de suas usinas.

Ao todo, foram mais de 100 contribuições, com a participação massiva de associações representantes de geradores e consumidores, além de empresas de geração e transmissão de energia elétrica.

Leia também: ANEEL busca solução para acúmulo de outorgas de geração

A corrida por outorgas se intensificou com a publicação da Lei 14.120/2021, que estabeleceu o fim do desconto de 50% das tarifas de uso dos sistemas de transmissão e distribuição (TUSD/TUST) para os projetos de energia renovável e definiu que o benefício do desconto do fio só seria válido para os projetos que protocolassem o pedido de outorga até 2 de março de 2022 e para os projetos que entrarem em operação em até 48 meses após as outorgas.

Essa mudança na legislação provocou a chamada “corrida do ouro”, que resultou no acúmulo de 108 GW de capacidade instalada de projetos de geração no final de março de 2023, equivalente a cerca de 13,5 anos de expansão de geração típica do país. Cerca de 17 GW vão pagar CUST esse ano sem que os projetos estejam em operação.

A proposta da agência é conseguir uma rescisão amigável dos CUST das centrais geradoras, concomitante à revogação das respectivas outorgas de geração e isenção de eventuais multas aplicáveis pela ANEEL, mas com algumas condicionantes como anuência de transmissoras; inexistência de débitos com transmissoras; renúncia de discussão judicial relacionada aos CUST celebrados; e inexistência de contratos comercializados no ambiente de contratação regulada.

Divergência entre agentes

A visão dos geradores e dos consumidores se antagonizaram quanto a esse tema, considerando as contribuições enviadas para a CP nº 15/23, às quais o Canal Solar teve acesso. Enquanto os geradores concordam com a proposta da Aneel, os consumidores defendem um maior rigor por parte do regulador, sob o risco de onerar ainda mais os consumidores de energia.

Quase todas as associações de geradores manifestaram-se favoráveis a solução da ANEEL, incluindo a ABIAPE (Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução), a APINE (Associação dos Produtores Independentes de Energia Elétrica), a ABSOLAR (Associação Brasileira de Emergia Solar Fotovoltaica) e a ABEEólica (Associação Brasileira de Energia Eólica e Novas Tecnologias).

Para ABSOLAR, o mecanismo deve abranger todos os agentes de geração, sem vedação de participação de empreendimentos com energia elétrica negociada no mercado cativo, assegurada a obrigação das geradoras de recomposição de lastro por meio de contratos bilaterais com as distribuidoras que não tiverem interesse na celebração de acordos para rescisão de CCEARs (Contratos de Comercialização de Energia no Ambiente Regulado).

A ABSOLAR entende que o escopo deve englobar:

  • A revogação da outorga de geração e a consequente rescisão dos CUSTs e Contratos de Conexão de Transmissão – CCTs celebrados;
  • A autorização para que as distribuidoras celebrarem acordos bilaterais para revogação de CCEARs das usinas enquadradas no mecanismo, mantido o direito à Exposição Involuntária;
  • A isenção das penalidades administrativas e multas rescisórias do CUST de agentes com contratos rescindidos por inadimplência;
  • Autorização para o parcelamento, em até 3 vezes, dos débitos de EUST em aberto;
  • Afastamento da aplicação da multa de mora de pagamento de parcelas do EUST;
  • Comprometimento da ANEEL e do ONS em anuir, em juízo, com pedido de renúncia das geradoras em processo judicial em curso sobre o tema;
  • Renúncia da ANEEL e do ONS quanto aos honorários sucumbenciais em relação aos processos judiciais em curso sobre o tema; e
  • Suspensão temporária de ações de fiscalização e processos punitivos que possam conduzir à revogação de outorgas de empreendimentos que apresentarem a carta de demonstração de interesse até 6 de junho de 2023.

As condições para participação voluntária no mecanismo regulatório seriam:

  • Estar adimplentes com suas obrigações e encargos setoriais;
  •  Não possuir débitos de EUST com as transmissoras;
  • Apresentar o comprovante de pedido de renúncia de qualquer discussão judicial relacionada aos CUSTs celebrados por meio do Termo de Declaração e Outras Avenças; e
  • Exclusivamente para o afastamento da possibilidade de aplicação de penalidades administrativas, apresentar, em prazo oportuno, termo de quitação de todas as obrigações de ressarcimento e indenizações de custos e investimentos relacionados com a rescisão dos CCTs.

A ABIAPE disse que concorda com o tratamento regulatório excepcional, pois entende que a medida busca reduzir a propagação de liminares que suspendam o pagamento de EUST (Encargo do Uso do Sistema de Transmissão). Estima-se que 7,1 GW encontram-se judicializados.

A ABIAPE entende, porém, que o mecanismo deve ser aplicado uma única vez, de forma a evitar precedentes jurídicos para quebra de contratos de uso da rede.

“O mecanismo será importante também para retirar da base de geração projetos de baixa probabilidade de implementação, aprimorando o sinal da expansão da geração, crucial para o bom funcionamento da operação e do planejamento do setor elétrico. Adicionalmente, a proposta poderá abrir espaço para revisão, pelo ONS, de pedidos de acesso, negados ou condicionados, relativos a projetos com viabilidade econômica e capacidade financeira para concorrer pela margem remanescente de transmissão no sistema por meio do Procedimento Competitivo de Margem (PCM)”.

“A APINE se manifesta favorável ao mecanismo regulatório excepcional proposto, com ressalva quanto a necessidade de anuência da transmissora. Como este é um condicionante para a adesão, e há dependência da concordância de um terceiro (transmissora), pode não haver um acordo rápido entre as partes e como consequência não se cumpra o requisito até 30 de junho, frustrando a adesão do agente.”

A ABEEólica se alinha à sugestão da ANEEL, mas destaca que a situação é oportuna para se abrir uma discussão sobre encaminhamentos que possam endereçar outras situações igualmente impactadas no contexto da evolução regulatória.

Já a ABRAGET (Associação Brasileira dos Geradores Termelétricos) discordou da proposta colocada em consulta pública, pois entende que a rescisão do CUST, sem pagamento da multa rescisória, acarretará em um acréscimo no rateio da TUST para geradores em operação que não tiveram a TUST estabilizadas, de forma a manter a recuperação da RAP (Receita Anual Permitida) das transmissoras.

Isso também se aplica ao aumento de TUST para os consumidores. Para associação, o ideal seria reduzir a multa de 3 anos de encargos rescisórios para 1 ano.

Segundo cálculos da ANACE (Associação Nacional dos Consumidores de Energia), considerando a TUST média na Rede Básica para o segmento geração, que para o Ciclo 2022-2023 foi de R$ 9.130/MW, os encargos de uso devidos pela soma de todo este potencial, mesmo considerando desconto de 50% nas tarifas, seria aproximadamente de R$ 970 milhões ao ano. Assim sendo a “multa rescisória” equivalente a 3 anos de EUST, atingiria cerca de R$ 2,91 bilhões”

Para a ANACE, o ‘perdão’ proposto pelo regulador parece uma oferta “excessivamente generosa” para empreendedores que assumiram os riscos de sua empreitada, além de abrir um precedente extremamente perigoso para o sistema e todo setor elétrico, o que não é nada desejável, alerta a diretora de Assuntos Técnicos e Regulatórios, Mariana Amim.

A Frente Nacional dos Consumidores de Energia demonstrou preocupação com a solução apresentada e disse que a Agência desconsidera os eventuais impactos aos consumidores de energia, que terão que suportar os custos adicionais do sistema de transmissão, a partir do próximo ciclo tarifário, em caso de rescisão de contratos sem nenhum tipo de penalidade, até que novas usinas se conectem ao sistema.

A entidade entende que a medida demonstra falta de isonomia entre os agentes do setor elétrico, pois imputa aos usuários da rede de transmissão custos provenientes de empreendedores que descumpriram seus acordos contratuais.

“É sempre oportuno destacar que todo empreendimento está sujeito a riscos de mercado e que o empreendedor possui conhecimento das regras existentes antes de sua tomada de decisão. A criação de mecanismos que abrandam eventuais exposições, em uma temática já consolidada, abre espaço para precedentes, que futuramente podem ser utilizados por outros agentes de forma oportunista”, diz a ABRACE.

Para a ABRATE (Associação Brasileira das Empresas de Transmissão de Energia Elétrica), o simples fato de permitir que empreendedores solicitassem outorga sem uma avaliação preliminar por parte das concessionárias de distribuição ou do ONS (Operador Nacional do Sistema), por si só, já foi um ato de descuido que fez com que a ANEEL autorizasse centrais geradoras sem sequer verificar se havia subestações com espaço suficiente para acomodar essa geração e escoar sua energia.

Também disse que “não constou da contextualização, a análise do problema de inadimplência de grande monta, com potencial de risco atípico que impacta diretamente as transmissoras. Ao desconsiderar a questão, o problema da inadimplência de encargo de conexão e da multa de rescisão do CUST, será imputado na integralidade ao sistema de transmissão, onerando assim, exclusivamente o segmento de transmissão, com questões advindas de uma situação conjuntural e excepcional”.

Wagner Freire

Wagner Freire

Wagner Freire é jornalista graduado pela FMU. Atuou como repórter no Jornal da Energia, Canal Energia e Agência Estado. Cobre o setor elétrico desde 2011. Possui experiência na cobertura de eventos, como leilões de energia, convenções, palestras, feiras, congressos e seminários.

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