O ano de 2021 foi extremamente marcante para o setor de energia solar. O segmento não só manteve o ritmo acelerado de crescimento, com recordes de geração em diversos estados, como também movimentou os noticiários brasileiros como em nenhum outro momento de sua história.
As discussões sobre a criação de uma legislação própria para o mercado de micro e minigeração distribuída, as contribuições da fonte para o enfrentamento da maior crise hídrica dos últimos 91 anos, além do retorno da feira da Intersolar (após dois anos de ausência) foram apenas alguns dos destaques.
Confira abaixo, neste conteúdo especial, uma seleção preparada pela equipe de jornalismo do Canal Solar com os fatos e acontecimentos que marcaram o setor fotovoltaico no Brasil e no mundo neste ano.
Políticas ambientais de Biden
O ano começou com a posse do presidente norte-americano Joe Biden e a implementação de um dos eixos que sustentaram a campanha vitoriosa do candidato democrata: o da valorização das fontes renováveis de energia e o retorno dos Estados Unidos ao Acordo de Paris.
Logo após assumir a Casa Branca, um dos primeiros atos de Biden como governante foi, justamente, cumprir esta promessa, com o anúncio de que em quatro anos mais de US$ 2 trilhões seriam investidos nos setores de construção, infraestrutura e transporte, o equivalente a mais de R$ 11 trilhões.
Os investimentos que passaram a ser feitos por Biden têm como meta um objetivo ousado: zerar as emissões de carbono na geração de energia elétrica nos EUA até 2050. O presidente americano, no começo do ano, também anunciou a capacitação de trabalhadores e empresas americanas para promover ainda mais a energia limpa no país, com destaque para a solar.
Ex-tarifários e redução de impostos
Ao longo do ano, o governo brasileiro concedeu centenas de isenções na alíquota para importação de equipamentos fotovoltaicos, como painéis, inversores e rastreadores solares. As isenções foram promovidas pela Camex (Câmara de Comércio Exterior), do MME (Ministério de Minas e Energia), com o intuito de fomentar o uso da fonte em todo o país, com validade até 31 de dezembro.
Nos bastidores, o Governo Federal já trabalha para prorrogar o regime de ex-tarifários no país junto aos países-membros do Mercosul, que precisam aprovar o pedido para que isso ocorra. A expectativa é a de que o acordo seja concluído já na reunião de cúpula do bloco, que será realizada no dia 16 de dezembro, em Brasília (DF).
Além disso, para equipamentos que não tiveram ex-tarifários, o Brasil também publicou algumas reduções nas tarifas de importação. O último desconto promovido, por exemplo, ocorreu no começo de novembro, com as alíquotas sendo reduzidas de 12% para 6% para painéis solares; de 18% para 9% para determinados tipos de baterias de lítio; e de 14% para 7% para inversores.
Frete marítimo e escassez de matérias primas
A crise energética na China foi outro ponto marcante do ano. O problema impactou a cadeia produtiva e fez com que milhares de pessoas começassem a sofrer com o desabastecimento causado pelas exigências do governo para descarbonizar a economia, pelo aumento da demanda de eletricidade e pela alta nos preços do carvão e do gás.
Por conta da crise e dos apagões contabilizados na China, o preço do polissilício – uma matéria prima imprescindível para a fabricação de painéis solares e que já vinha acumulando significativos aumentos desde janeiro – atingiu patamares nunca antes vistos. O resultado culminou com um aumento significativo do valor dos sistemas fotovoltaicos em todo planeta.
A demanda do mercado e as movimentações de fabricantes de material de silício – que criaram, de forma deliberada, a ilusão de uma séria escassez de polissilício e wafers de silício – também incentivaram intermediadores a acumular e elevar os preços dos produtos.
A medida também prejudicou o setor fotovoltaico ao longo de 2021, que viu o preço da matéria-prima bater recordes. Antes mesmo de o primeiro semestre terminar, estatísticas preliminares mostraram que o estoque da indústria em abril e maio havia aumentado 61,8% em relação ao mês de março.
Todas essas incertezas levaram diversas empresas, de vários segmentos, a suspender suas atividades em todas as regiões da China. A Apple e a Tesla, por exemplo, cancelaram a produção em algumas fábricas chinesas por vários dias para cumprir políticas mais rígidas de consumo de energia, colocando as cadeias de abastecimento em risco.
Além disso, outro problema que afetou negativamente o setor de energia solar foram os surtos de Covid em várias regiões chinesas. Isso porque, após conseguir controlar a primeira onda do vírus, o país passou a registrar vários focos da variante Delta.
Somente neste ano, dezenas de portos foram fechados após a descoberta de funcionários contaminados com a doença, o que atrasou a entrega de produtos e inflacionou os preços. O caso mais emblemático aconteceu no porto de Ningbo, que ocupa o terceiro lugar no ranking global de movimentação de contêineres. O espaço ficou fechado por duas semanas, após autoridades locais constatarem que um único trabalhador foi infectado.
Fora da China, outros problemas também influenciaram a alta de preços do frete internacional, como foi o caso do encalhamento do navio Ever Given, no Canal de Suez, no Egito, no começo deste ano.
O incidente causou problemas para diversos setores do mundo, entre eles o de energia solar, que viu o preço do frete marítimo disparar devido à indisponibilidade de contêineres pelo atraso provocado para a retirada da embarcação, de 400 metros de comprimento. Ao todo, a embarcação ficou seis dias sem conseguir se locomover no Canal de Suez, uma das principais travessias marítimas do mundo para o transporte de mercadorias e matérias-primas e responsável por cerca de 10% do comércio marítimo internacional.
Marco Legal da GD
A votação do PL 5829 (Projeto de Lei 5829/2019), que prevê a criação de uma legislação própria para o segmento de micro e minigeração distribuída no Brasil, foi ao longo de todo o ano foi um dos acontecimentos mais comentados no setor de energia solar.
Inicialmente, a proposta estava prevista para ser votada no início do ano passado, mas acabou sendo postergada devido à pandemia da Covid-19. O tema foi retomado em dezembro de 2020, quando a maioria dos deputados votou pela urgência do texto, permitindo que fossem puladas algumas etapas no processo de tramitação e o projeto fosse direto para votação.
Antes de ser aprovado pelo Senado, com emendas, e novamente aprovado pela Câmara dos Deputados, o projeto foi colocado em pauta para votação nas duas casas por diversas vezes. A demora para votar o texto, de autoria do deputado Silas Câmara (Republicanos-AM) e relatoria do deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), culminou com uma mobilização em torno do projeto, ao ponto de reunir centenas de participantes, em Brasília (DF), no dia 8 de junho deste ano.
A proposta só foi aprovada pelos deputados quase um mês depois, no dia 18 de agosto, com a maioria absoluta dos votos: 476 a favor, três abstenções e apenas três contrários. Dois meses, depois, veio a aprovação no Senado, com emendas, o que obrigou o texto a voltar para a Câmara para uma última votação. O texto foi aprovado, no começo do mês, e aguarda sansão presidencial para virar lei.
Transição energética em alta
As políticas ambientais e a necessidade de municípios, estados e países se unirem em prol do meio ambiente e da adoção de medidas que valorizem a produção de fontes de energia limpa – entre elas a solar fotovoltaica – gerou inúmeros acordos internacionais ao longo de 2021.
O principal ocorreu em Glasgow, na Escócia, no começo do mês de novembro, com a reunião de cerca de 200 países na COP26, a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Durante o encontro, a cúpula anunciou o documento definitivo com metas a serem seguidas por todos.
Essa foi a primeira vez, em todas as 26 edições do evento, em que o carvão, o petróleo e o gás natural aparecem como os principais causadores das mudanças climáticas na conclusão da cúpula, sendo reconhecida explicitamente a necessidade de o planeta realizar a transição de combustíveis fósseis para renováveis.
Além da COP 26, outro acordo que movimentou o ano foi a campanha “Race to Zero” da ONU (Organização das Nações Unidas) com cidades, estados e empresários visando zerar as emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2050, contribuindo para manter o aquecimento global abaixo dos 1,5 ºC, previsto pelo Acordo de Paris.
A iniciativa busca alcançar a meta por meio da intensificação de ações de descarbonização, da atração de investimentos para negócios sustentáveis e para a criação de empregos verdes. Desta maneira, entende-se que será possível viabilizar um cenário de desenvolvimento socioeconômico inclusivo e sustentável.
No Brasil, a medida foi acatada por diferentes estados, como São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Pará e Panará. Todos eles se juntaram a outras regiões do globo como Califórnia, Nova Iorque, Havaí e Washington, nos Estados Unidos; Catalunha, Madrid e Navarra, na Espanha; além de outros estados em países como Suécia, Austrália, Reino Unido, Canadá, Alemanha e Bélgica.
Crise hídrica
Com a chegada do período de estiagem na maior parte do país, os principais reservatórios do país – sobretudo das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste – sofreram um enorme esvaziamento em 2021, o que tornou a produção energética mais difícil e cada vez mais cara.
Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a escassez de chuvas no país para a geração de energia elétrica foi a pior em 91 anos. O problema fez o Governo Federal se ver obrigado a recorrer ao uso das usinas térmicas – uma fonte mais cara, cujo custo é repassado ao consumidor – para evitar apagões e o racionamento de energia.
O acionamento destas usinas fez com que as famílias brasileiras tivessem que pagar mais caro para utilizar eletricidade em suas residências e passar a lidar com uma alta de preços em outros setores da economia, como no gás de cozinha e nos itens da cesta básica, por causa dos efeitos da inflação.
Ao todo, foram quatro aumentos no valor da conta de luz entre janeiro e novembro deste ano. O maior deles ocorreu na última semana de outubro, quando o Brasil anunciou a criação de uma nova bandeira tarifária no valor de R$ 14,20 para cada 100 kWh consumidos. O anúncio foi feito por André Pepitone, diretor-geral da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica).
Chamada de Bandeira Tarifária “Escassez Hídrica”, a iniciativa provocou um aumento significativo na tarifa média dos consumidores e com um crescimento substancial da população na busca por sistemas fotovoltaicos, com o objetivo de gerar a sua própria energia e economizar. A previsão é de que a nova bandeira continue valendo até abril de 2022 e sofra novos aumentos até lá.
De acordo com dados da ANEEL, somente em 2021, o reajuste acumulado para os consumidores já ultrapassou a barreira dos 7% e para 2022 a agência acredita que a tarifa ficará 21,04% mais cara. Se contar todos os acréscimos, incluindo os reajustes anuais, e com o valor base sendo a bandeira verde, a conta de energia elétrica subiu em um patamar médio de 25% em relação à tarifa no início do ano.
Com o país encurralado pela bandeira vermelha, por uma inflação cada vez maior e por uma conta de luz cada vez mais salgada, profissionais do setor de energia alertam que é preciso diversificar a matriz energética nacional o mais rápido possível para que o país não dependa apenas da energia que vem das hidrelétricas.
Empresas & Negócios
O movimento de fusões e aquisições de empresas do setor de energia solar ganhou força em 2021. Em agosto, a distribuidora de equipamentos fotovoltaicos Aldo Solar, por exemplo, foi comprada por um fundo de private equity da Brookfield Business Partners. O valor da transação não foi revelado.
A Brookfield é uma sociedade limitada de capital aberto que possui e opera ativos de energia renovável, tendo a sua sede no Canadá. A compra da Aldo por parte da empresa representou um grande impacto para o setor, mostrando que grandes empresas do setor elétrico apostam no mercado de energia solar fotovoltaica.
A aquisição promete fazer da empresa brasileira uma marca ainda mais fortalecida no mercado de geradores solares para geração distribuída no Brasil. Somente em 2020, a empresa registrou um faturamento de R$ 1,6 bilhão em vendas.
Outra aquisição que mexeu com o mercado aconteceu em novembro, após a Array Technologies fechar acordo para adquirir a STI Norland por aproximadamente € 570 milhões – cerca de US$ 652 milhões, na cotação da época.
Segundo as companhias, os negócios combinados terão posições de liderança na América do Norte, América Latina e Europa, os três maiores mercados de energia solar fora da China. A transação será concluída no primeiro trimestre de 2022.Além da compra e venda de empresas, grandes multinacionais também adentraram no mercado de energia limpa neste ano.
O Grupo Shell, por exemplo, lançou em setembro um segmento próprio voltado para a transição energética e a descarbonização. A iniciativa da petroleira é oferecer ao mercado brasileiro produtos com menor impacto ambiental e comercializar energia elétrica por meio de fontes renováveis (usinas solares e eólicas) e energia de baixo carbono (térmicas a partir do gás).
Neste ano, a Shell também deu um passo importante para a construção do seu primeiro projeto solar no Brasil, com a assinatura de um termo de cooperação com a produtora de aço Gerdau para o desenvolvimento de uma usina fotovoltaica de 190 MW. A planta será construída no município de Brasilândia de Minas (MG).
O retorno da Intersolar
A Intersolar South America, maior feira do setor solar da América Latina, bateu o recorde de público na edição de 2021. A feira – que foi realizada no Expo Center Norte em São Paulo (SP), nos dias 18, 19 e 20 de outubro – não ocorria desde 2019 por causa da pandemia da Covid-19.
O evento reuniu aproximadamente 28 mil visitantes nos três dias de exposição, superando as expectativas de 25 mil pessoas, recorde da última edição da feira. De quebra, superou também o público da Intersolar Europe Restart 2021, realizada duas semanas antes, que registrou a participação de 26 mil visitantes.
Na abertura oficial, Rodrigo Sauaia, presidente da ABSOLAR (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica), destacou que a energia solar é hoje um instrumento mais do que fundamental na recuperação econômica e social do país, em meio à pandemia e à crise hídrica. Ao todo, mais de 250 expositores exibiram suas últimas inovações em produtos e serviços na edição brasileira.
O Canal Solar participou do evento como a imprensa oficial brasileira, realizando mais de 200 entrevistas com expositores, visitantes e a equipe organizadora da Intersolar. Além disso, contou com um estande próprio, que foi ponto de encontro dos profissionais do setor, que aproveitaram a oportunidade para discutir os avanços tecnológicos, novos negócios e o crescimento do mercado. O estande também foi palco de palestras aos frequentadores.
Popularização da energia solar e o marco de 12 GW
O Brasil ultrapassou, em novembro, a marca histórica de 12 GW de potência operacional da fonte solar fotovoltaica em usinas de grande porte e em sistemas de pequeno e médio portes instalados em telhados, fachadas e terrenos.
Ao todo, já são mais de 4,5 GW de potência instalada em usinas solares do segmento de GC (geração centralizada), o equivalente a 2,4% da matriz elétrica do país, e mais de 7,5 GW em GD (geração distribuída), que já é a sexta maior fonte de geração do Brasil, com empreendimentos em operação em diversos estados.
O recorde também reforçou o crescimento do setor fotovoltaico nos últimos anos, que viu a sua potência operacional mais do que dobrar em menos de dois anos, saltando de 5 GW em abril de 2020 para os atuais 12 GW.
De acordo com a ABSOLAR (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica), a fonte já trouxe ao Brasil mais de R$ 58 bilhões em novos investimentos, além de R$ 15,6 bilhões em arrecadação aos cofres públicos e mais de 347 mil empregos acumulados em menos de dez anos.