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Tomada de Subsídios ANEEL 18/2023: é o fim da geração compartilhada?

Segundo a ANEEL, é preciso avaliar a necessidade de eventuais comandos regulatórios específicos para
Canal Solar Tomada de Subsídios ANEEL 182023 é o fim da geração compartilhada
Foto: Freepik

Com colaboração de Isabella Agarbella, Leonardo Balbino e Renato Edelstein

A ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), por meio da Superintendência de Mediação Administrativa e das Relações de Consumo, instaurou a TS 018/2023 (Tomada de Subsídios n° 018/2023), com período para envio de contribuição até 31 de janeiro de 2024, por meio intercâmbio documental.

O intuito da TS 018/2023 é avaliar a necessidade de eventuais comandos regulatórios específicos para:

  • Garantir o disposto no artigo 28 da Lei n° 14.300/2022 – conhecida como o marco legal da micro e minigeração distribuída, o qual caracteriza a MMGD a como produção de energia elétrica para consumo próprio; e
  • Mitigar a ocorrência de mecanismos de comercialização de energia no SCEE (Sistema de Compensação de Energia Elétrica) de excedentes ou créditos de energia, em desacordo com a regulamentação vigente. Isto é, a oferta dos excedentes de energia a preços menores do que as tarifas reguladas praticadas pelas concessionárias ou permissionárias de distribuição de energia elétrica.

Por meio da TS 018/2023, os agentes e demais interessados poderão ser enviar as contribuições a partir do preenchimento de um formulário, no qual os interessados responderão às perguntas técnicas da ANEEL, como: “Quais situações existentes no mercado podem ser enquadradas como comercialização de energia no SCEE?” e “Quais elementos poderiam caracterizar ou dar indícios de uma comercialização de energia no SCEE?”, dentre outras questões.

O tema já estava sob análise da ANEEL desde a 3ª RPO (Reunião Pública Ordinária) da Diretoria, realizada dia 7 de fevereiro deste ano, que aprovou a Resolução Normativa ANEEL nº 1.059/2023 e definiu regras para a conexão e o faturamento de centrais de geração distribuída nos sistemas de distribuição, vedando a comercialização, ainda que implícita, de créditos e excedentes de energia, bem como a obtenção de qualquer benefício na alocação dos créditos e excedentes de energia para outros titulares.

Na 3ª RPO a Diretoria também determinou que a STD avaliasse a necessidade de se incluir comandos regulatórios para promover a aplicação do disposto no art. 28 da Lei n° 14.300/2022, o que levou à elaboração da Nota Técnica n° 101/2023 – STD/ANEEL, de 17 de outubro de 2023, cujo detalhamento foi objeto da TS 018/2023.

O objetivo, segundo a ANEEL, é impedir que haja a operação de compra e venda de energia pelos consumidores que não sejam livres ou especiais. Isso porque, o descumprimento dos normativos ou a tentativa de burlar os dispositivos legais para benefício próprio, prejudicam o setor elétrico como um todo, já que a captura indevida dos subsídios tarifários traz prejuízos de alta magnitude, às custas de incentivos custeados pelos usuários do sistema de distribuição de energia – o que não deve ser permitido na visão da Agência Reguladora.

Ainda que o escopo da TS 018/2023 seja conter a comercialização de energia elétrica no âmbito do SCEE, destaca-se que as ressalvas legais, previstas nos artigos 24 e 36-A da Lei nº 14.300/2022, não sofrerão quaisquer interferências na nossa visão.

Com isso, o cenário de comercialização de excedente de energia com a distribuidora local, por meio de chamadas públicas e o cenário de comercialização de excedente de energia elétrica com órgãos públicos (desde que o titular seja beneficiário de programa social ou habitacional das esferas federal, estadual, distrital ou municipal) permanecerão surtindo os mesmos efeitos após a devida regulação e implementação.

Também vale pontuar que a análise realizada pela STD, por meio da NT 101/2023, em nada alterou os direitos de compensação e compartilhamento de energia elétrica aplicável às unidades consumidoras com MMGD na nossa análise.

O consumidor titular de unidade consumidora, seja por autoconsumo remoto ou geração compartilhada (em que são formados consórcios, cooperativas, condomínio civil voluntário ou edilício, ou qualquer outra forma de associação civil desde que instituída para esse fim) pode continuar gerando o seu excedente e crédito de energia para ser utilizado em outras unidades consumidoras de sua titularidade e atendidas pela mesma distribuidora.

Uma vez implementado o projeto de acordo com as diretrizes legais vigentes, não há qualquer ilegalidade a ser avaliada pela ANEEL.

Ou seja, tais premissas não sofreram qualquer alteração, haja vista que a Agência sequer possui a competência para alterar ou restringir esses direitos atrelados aos titulares de MMGD, devido às previsões expressas no art. 1°, inc. X e Capítulo IV, da Lei n° 14.300/2022 (e REN n° 1.000/2023).

Por mais que o mercado esteja inseguro sobre a dimensão dos efeitos da TS 018/2023, sobretudo no que se refere à compensação de energia elétrica na conta de luz por meio dos sistemas de MMGD, limitar esse direito dos titulares de unidades consumidoras não faz parte da atribuição da ANEEL e seria um retrocesso para a expansão do modelo de varejo da GD (geração distribuída).

Na nossa visão, não cabe à ANEEL interferir em modelos de negócio que estão sendo praticados no setor de geração distribuída.

Não havendo ilegalidades em tais modelos, quer nos parecer que a Agência Reguladora, com medidas como a instauração da TS 018/2023, acaba por criar insegurança jurídica nesse setor, que tanto lutou para que tal segurança viesse com a publicação da Lei nº 14.300/2022.

Eventuais estruturas que extrapolem as diretrizes legais certamente devem ser impedidas e combatidas, mas as exceções devem ser tratadas e não a regra geral que permite a alocação de créditos de energia no modelo de geração compartilhada, que é um modelo previsto em Lei e que permite aos consumidores a locação de créditos de energia de usinas instaladas dentro da área de concessão das distribuidoras, incluindo o formato de “energia por assinatura” que passou a ser implementado no Brasil para os consumidores de baixa tensão (grupo B) que ainda não possuem demanda mínima para migrar para o mercado livre.

O setor de geração distribuída precisa, definitivamente, de segurança jurídica e previsibilidade para garantir a curva expressiva de investimentos que se viu nos últimos tempos. Esse movimento é natural e não deve ser barrado ou impedido por meio de regulação restritiva.

Cabe lembrar que, até o presente momento, os benefícios da geração distribuída para o sistema não foram calculados e/ou definidos, apesar do prazo estabelecido no marco legal da GD. Esse debate é imprescindível e está sendo deixado de lado mais uma vez. 

A condução da TS 018/2023 será importante para que o setor possa identificar qual será o endereçamento dado pela ANEEL sobre o tema. O que se espera (e confia) é que a TS 018/2023 não coloque em xeque todas as conquistas dos últimos anos.


As opiniões e informações expressas são de exclusiva responsabilidade do autor e não obrigatoriamente representam a posição oficial do Canal Solar.

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Pedro Dante
Sócio da área de energia da Lefosse Advogados. Presidente da Comissão de Estudos de Regulação do Instituto Brasileiro de Estudo do Direito de Energia. Coordenador do Comitê de Energia e Arbitragem da Câmara de Arbitragem Empresarial. Árbitro na Câmara de Medição e Arbitragem do Oeste da Bahia. Membro efetivo da Comissão de Direito da Energia da OAB/SP. Advogado especializado em assuntos regulatórios relacionados ao setor de energia elétrica com mais de 19 anos de atuação no setor.

3 respostas

  1. Não vejo dessa forma. Permitir aos consumidores a locação de créditos de energia dentro do formato de energia por assinatura para consumidores de baixa tensão do Grupo B é uma forma de burlar a Resolução Normativa ANEEL nº 1.059/2023. Esse tipo de regulação é parte da atribuição da ANEEL e não creio que seja “um retrocesso para a expansão do modelo de varejo da GD”. Abraço.

  2. A ANEEL tambem está preocupada com a quantidade de créditos excedentes que expiram em 60 meses, os quais ficaram para distribuidora? Esses créditos representam a energia que a distribuição repassou a seus consumidores cobrando por eles, e não vão ressarcir o cliente de GD. Esse pode ser um grande montante em razão do total de consumidores de GD que não utilizam todos seus créditos. A revisão tarifária vai contemplar isso de alguma forma para ajudar na tarifa? O ideal era que a distribuidora comprasse esse crédito quando vencer o prazo …

  3. E preciso uma fiscalização pelos órgãos representativos do sistema de geração de energia solar tais como ABSOLAR e também a criação de associações de geradores GD a nível municipal e estadual juntamente com ABSOLAR que já representam a nível nacional. No meu entendimento como integrador e também gerador tem muito o que se aprimorar tanto no sistema solar quanto ao que desrespeito às concessionárias.

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